sábado, 30 de mayo de 2015

Efêmero domingo no Beco do Oitavo

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Pelas nove da manhã um maravilhoso sol em Porto Alegre. Estamos em mesas espalhadas defronte ao Beco do Oitavo. Eu no meio de duas mesas juntas na ponta da calçada, nóti aberto, meu companheiro do lado é Luciano Peregrino, para o caso desta joça empacar, ele sabe tudo de computador de mão. Só não tem solução quando o sinal some. Cobram os olhos da cara e não fornecem o sinal como prometido, aqueles... bem, isso é outro papo, hoje não vamos falar de máfia. Acho que não.

Aqueles filhos de uma puta das múltis!

O Contralouco está sinalizando o fechamento da rua, já colocou os cones numa ponta, caminha para a outra. Domingo é assim, quem manda são os boêmios, a prefeitura já tem o resto da semana para não trabalhar. Aqui carro não passa, a criançada pode brincar na rua. Nossos cones são cor-de-vinho, para diferenciar dos cor-de-laranja da Prefa, a nossa cor serve para avisar aos moradores das outras ruas do bairro: podem chegar que hoje tem festa. Aliás, o Portuga disse que cedinho viu passar um carro com três fanáticos do bando do J. Bolsonaro.

A turma se alvoroçou - ai que vontade de quebrar a cara dos viados - mas o Portuga intervém, acha que foi por descuido, estavam chapados e não lembraram que aqui não podem fazer o que fazem na Rua Paulista.

Marquito Açafrão foi lá no Botequim do Terguino buscar o tonel e os espetos para o churrasco, os malucos que agora estão lá o ajudarão a trazer, vem todo mundo. Nisto chega a velha Jezebel fantasiada de cigana, se contorcendo e cantando "Ai se eu te prego". Recebe uma vaia estrondosa. Em seguida ganha efusivos aplausos, quando a turma percebeu que a letra é diferente daquela do sertanojo. Não podemos aqui declinar a belíssima letra, tem muita rima em u, ica e eta.

Trago rolando, os boêmios aos poucos começam a falar de como foi a noite de sábado. Isso vai demorar, muita gente ainda não chegou. O gaiteiro Nino emudece a rua com os acordes de La Vie en Rose. Peço ao Portuga um duplo de uísque com angustura. Leila Ferro se aproxima timidamente e diz: "Tio Sala, enquanto o pessoal prepara tudo, será que eu poderia botar uma música no teu blog?". Levanto-me prontamente: "Claro que pode. Vou no banheiro, doçura, bote tu mesmo!". E passo esta geringonça para a Leila, que senta no meu lugar.

Mr. Hyde, o médico da confraria, que passou a noite de plantão no Pronto Socorro, chegou ainda de jaleco com um barril de chope às costas. Enquanto passa em direção ao interior do bar, vai avisando: "É só pra mim, seus palhaços, hoje quero me afogar, o que vi de madrugada ninguém merece, mesmo com 20 anos de profissão!". Putz, ficamos imaginando. Daqui a pouco relaxa e se solta, já chegou desabafando, é só do que precisa.

Onze e meia da manhã. Tocaram cinco vezes a música da Leila, as mulheres dançando como a Tulipa.

Contralouco: "Essa moça, a Tulipa Ruiz, é o meu tipo, docinha e gostosa, viva... Eu casava para sempre, levaria flores todos os dias".

Jussara do Moscão: "Pára, Contra, não vai azarar a vida da guria...".

Contralouco: "Mas é sério, pombas! Aqui nunca se pode ser sincero!". E saiu emburrado lá para a frente do bar. Gustavo Moscão olha de lado para a Jussara, magoou por quê?

Um dos assuntos que tomou as mesas foi a croniqueta que Salito de la Noche postou ontem no blog, "Eu vou botar teu nome na macumba", a tigrada gostou, contei sobre o dia em que Gustavo Moscão surrou um urubu evangélico de fatiota.

Gustavão todo humilde na mesa da ponta, minimizando: "Ora, não foi nada, gente, só uns tapas, ele tinha só uma faquinha, briguinha...". Ora, depois da "briguinha" arrastou o sujeito pelos cabelos por dois quarteirões...

Chegou o boêmio, ator e dramaturgo Nicolau Gaiola. Em pé, também não precisou pedir a atenção de todos, já o esperavam. Copo de chope na mão, começou:

"Senhores seus e senhoras minhas, em nome dos empinantes do Oitavo e do Terguino, proponho um brinde pela liberação da cerveja, de todas as marcas do mundo, em todos os ambientes do Brasil".

Todos encheram os copos e se puseram em pé, a quem passasse pareceria que se preparavam para cantar o hino nacional.

Secaram os copos, a turma voltou a sentar, e Nicolau prosseguiu:

"Nos estádios de futebol e de todos os esportes, nem preciso falar: há que se colocar torneiras de cerveja gelada nas arquibancadas, é o mínimo que se pode esperar. O Lula51 pretendia fazer isso, mas os conservadores o compraram naquele pacote da carta de Recife. E vamos dar um fim à discriminação aos doentes, começando por incentivar os bares dos hospitais...".

Mr. Hyde estremeceu e deu um salto para a frente: "Não, misericórdia, hospital não, pelo amor de Deus!".

Nicolau levou um susto, se atrapalhou, e continuou tentando se recuperar:

"Bem, ã, sobre hospitais então vamos rediscutir o assunto mais tarde, o Hyde ainda tá nervoso. Mas e as igrejas, meus amigos, as malditas igrejas, como aguentar sem uma cervejinha gelada?! Os coveiros como aquele do Moscão, os botaremos no seu lugar, isto é, de garçom! Já os da católica, pelas roupas parecerão garçonetes! Com música!".

Aplausos frenéticos, viva, bravo! As mulheres se finando de rir.

"Na Câmara de Vereadores!, na Assembléia Legislativa!, no Congresso Nacional!, bêbedos talvez os amigos do alheio façam algo que preste, além de aumentar os próprios salários todos os dias! Nos bancos, liberar nos bancos, meus amigos, só meio bebum para aguentar as taxas daqueles agiotas!".

"Nas faculdades, um barrilzinho de 20 litros por sala de aula!. Como estudar, tolerando a péssima qualidade do ensino e dos professores durangos, sem um chopinho à mão, como, como!?".

Os malucos começaram a se meter no seu discurso, acrescentando locais, sugerindo também mesas de sinuca em todos, e melou tudo.

(...)



lunes, 11 de mayo de 2015

Alô, sou eu, mãe

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Feliz Dia das Mães! Estou lejos mas me sinto aí junto da senhora.

(...)

Sim, mãe, prometo ficar calminho doravante, ontem foi a última vez que me incomodei pra valer, mas a senhora sabe que faz tempo que não ando armado, então não deu nada, pois não sou moleque para andar de briga de mão. Quem lhe contou isso?

Tinha que ser aquele otário, vai me pagar.

Sim, entreguei todas as armas pros palhaços do desarmamento, bem..., sim, todas. O quê, a Marília viu uma automática? Só uma? Deve ter sido esquecimento, amanhã mesmo entrego aos palhaços, junto o silenciador que é proibido para pobres, como as armas o são, eles podem...

Não tive culpa, a senhora me conhece: primeiro foi aquele vizinho corno, depois uns abobados naquele teatrinho nojento do São Pedro, antro de gigolôs do povinho, depois aquele médico asqueroso, pedófilo, no Beco do Oitavo.

Estou calmo, mãe, é que dá raiva só de lembrar. O quê, por me conhecer? Manhe, eu mudei, sou adulto, e aquela gente merecia um tiro. Óbvio que não vou mais.

Sim, tou dizendo, não entro mais em baile de cobra. Como? Ora, mãe, essa estória de ter 26 mulheres é brincadeira com os amigos, no meu apartamento nem caberiam tantas.

Claro que estou procurando namorada, mãezinha. Sei que já estou moço, 62, hora de criar juízo com uma boa companheira, a senhora me diz isso todos os dias.

Sim, uma mulher culta, sincera.

Peraí, essa parte, se vai ser alemoa, nega ou marciana, eu é que resolvo.

Tá... me cuido sim, meus créditos vão acabar, de noite ligo de novo.

Beijos, a senhora é a luz da minha vida. Carpe diem, nunca esqueça que o Toninho lhe ama. Ó, espera, não esqueça de tomar os remédios!
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