lunes, 8 de noviembre de 2010

Na cama de outro - Parte 3

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Por Síndia Santos


Mais uma vez a porta bateu, encerrando-me agora num sepulcro cheio de sombras. A pena era aplicada: a insuportável vida latejava.

Um passo fazia a carne vibrar em toneladas de energia, olhar pedia uma força que a consciência não liberava. Agora, sim, a culpa.

Redimi-me ouvindo o que tinha para ser dito em ligações que cortavam a madrugada em xingamentos. Nenhum sentimento me tomava, eu era a pura abstração aprisionada no sentido de cada palavra: fraca, inconstante, volúvel, insatisfeita; porém desperta.

Não havia como me esconder da própria existência. A prova do meu crime eram as marcas em meu corpo. A ferro e fogo imprimi-as sobre a pele como castigo por ousar existir. Não, não havia como dizer que não era nada, contudo só valeria a pena se fosse amor.

Fechei os olhos em busca de amor num dos quartos de motéis que se misturavam em minhas lembranças.

Meu amante nu, sentado à beira da cama, sorria enquanto estendia as mãos entregando-me um copo de suco de laranja. Deitei-me de bruços ao seu lado, enquanto ele acariciava os cabelos que se esparramavam por minhas costas.

- Acho que nunca amei ninguém, ele me dizia.

Um perfeito estranho com o qual me sentia à vontade. Um homem que mal me conhecia e não fazia questão de me conhecer. Eu também não queria perguntar quem ele era, queria apenas sua mão escorregando por minhas costas nuas, queria o desejo refletido em seus olhos, queria o mistério que sua boca encerrava. Queria descobri-lo sem palavras.

Sua partida não causou saudade, causou estranheza, como letras sem significado num livro. Ele fechou os olhos, e me cegou. Valores, princípios e idéias, ele trouxe o vácuo que fez o mundo perder todo o sentido. Sem querer, a descoberta de hábitos que não eram meus, deuses que não era meus, mas que estavam lá, em algum lugar de mim.

Amor era sentimento nada abstrato que não se contenta em ser palavra; uma vez chamado ganha forma, vida, como havia me ensinado Virginia Woolf. Amor é a oração que nos faz dar um passo adiante, ato de fé.

Tomei coragem e disquei os números.

- Sua esposa ligou para o meu marido.

Meu amante ficou mudo e depois negou. Sua esposa estava deitada sobre a cama, remoendo a dor por ter lido nossas confidências. Sabíamos disso, mas em nome do que iríamos desestabilizar a mentira que a fazia sentir-se segura?

Pus-me de joelhos num altar sem velas. Espaço vazio de desejo morto, sem pernas. Arrastava-me nas afiadas ruas da lembrança, o meu deus se misturava a mim, abençoava-me, me tornava humana.

Sorte. Há pessoas que levam a vida inteira sem perceber que não têm vontades, desejam o que esperam que desejem. Meu deus é feito de carne e osso, repleto de imperfeições e tristezas, meu deus finge ser feliz porque almeja ser feito de éter; e é. O meu deus precisava ganhar sentido.

(Segue e termina AQUI, uma pena, ficaria a lendo por anos)
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