viernes, 7 de agosto de 2020

MORTE LENTA

 

MORTE LENTA

Ninguém morre de repente. / Quando dizem que Fulano / faleceu subitamente, / morreu estupidamente, / é engano, / é puro engano!

Pode ser que a ave ferida / ou a árvore abatida / ou a casa demolida / ou outras coisas assim / deixem de súbito a vida / (vida ou coisa parecida), / achando um súbito fim.

Mas quanto aos seres humanos, / nenhum morre de repente. / É um processo inteligente, / lentamente, lentamente, / Leva meses, leva anos.

Leva o tempo em que a viúva / faz a presença do ausente. / A saudade permanente / é um longo dia de chuva. / Lembramos diariamente / o bar que ele freqüentava / os cigarros que fumava, / as coisas que planejava. / Tudo aquilo que era dele / volta à baila noite e dia. / O mundo ficou sem ele / como uma casa vazia. / As canções que ele cantava! / As piadas que dizia!

Passam anos...Cinco...Sete... / Quem ainda se lembrava? / O bar que ele freqüentava / virou uma lanchonete.

As canções que ele cantava / são do tempo do Chalaça. / As piadas que contava / hoje não teriam graça. / O mundo se modifica. / Os cigarros que fumava / Nem a fábrica fabrica. / A viúva, conservada, / Está de novo casada, / E dizem que ficou rica.

Agora sim, falecido! / Agora sim, faleceu! / Anos após ter morrido, / Só – de todos esquecido – / Depois que tudo o esqueceu!

Ninguém morre de repente. / Quando dizem que Fulano / faleceu subitamente, / morreu estupidamente, / é engano, / é puro engano. / Gente morre lentamente, / lenta e dolorosamente, / dia a dia, ano após ano!

Giuseppe Artidoro Ghiaroni ((Paraíba do Sul, RJ, 22/2/1919 - Rio de Janeiro, 21/2/2008).

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