Não posso ver PM, confesso,
me dá um nojo... Não dos pobres homens fardados, uns bichos analfas, alguns,
outros à procura de futuro, estes últimos gente boa, tem família, obedecem por
um salário miserável. Todos precisamos comer, né. Bem, os criminosos de farda,
já bandidos, também tem família.
Outro dia fiquei amigo de
dois PMs aqui na Cidade Baixa, os guris de plantão na esquina da Rua da Olaria
com a... deixa assim. Ia passando, e aí, camaradas, estão em pé há horas,
vi de manhã, vou buscar umas cadeiras, tem um boteco ali adiante, ele me
empresta... Não, senhor, muito obrigado, disse um. A esta hora não tem crime,
de madrugada é que fede. Não senhor, a gente tem que ficar aqui em pé até às
18h, não pode sentar, disse outro. Homens de 25 ou 28 anos, cada um dava um e
meio de mim, bem preparados fisicamente.
Bem apessoados, bonitões, gentis, para mim não escapou o fugaz olhar de medo de um mundo estranho que não conheciam.
Bem apessoados, bonitões, gentis, para mim não escapou o fugaz olhar de medo de um mundo estranho que não conheciam.
Puxando papo me contaram a
vida, como passei alguns horrorezinhos tenho facilidade de comunicação. De dar
dó, mentiram na prova para serem aprovados no nazismo. Logo serão como os
outros, pela contaminação, isso eu não disse a eles, vamos com calma.
Sabem usar a arma? Mais ou
menos, Sala. Nessas alturas eu já era de casa, disse que eu era o escritor
pobre da Cidade Baixa, um já tinha ouvido falar. Se sabem mais ou menos
precisam treinar, tem que pegar a arma como se pega em moça, mas rápido, e
estão mal ajeitadas, puxem mais para lá e deixem o fecho descolado. Ensinaram
que só se toca em arma em perigo real, crime acontecendo? Sim, Sala, ensinaram.
Tá bom, muito cuidado, vou tomar uma cerveja e volto aqui na hora de ir embora,
vocês são uns ótimos policiais, meus fios, té mais "Fulano", té mais,
"Sicrano".
Não sei se os verei
novamente, mas vou escrever sobre as duas horas de conversa que tivemos. Jamais
os esquecerei, nem eles esquecerão de mim.
De madrugada dá morte,
tiros, berros até ao amanhecer. Calçadas cheias de sangue. Quem recebe propina
dos bares por isso, para não se ver um PM na rua? Os meninos que ficaram meus
amigos é que não são.
Não, a culpa não é daqueles
trogloditas de capacete quando em turno de serviço, de plantão para espancar
manifestantes, machucar professores desarmados, pessoas que lutam pelas
famílias também deles, os PMs, e sim de quem está em cima, de quem sempre
esteve em cima. E da incompetência da esquerda quando no poder.
Não mudou nada, bem que no
RS o seu José Paulo Bisol tentou certa vez. Sem tirar a valentia, a prontidão
para a luta, matar ou morrer, mas mudar algo naqueles cadernos podres da
ditadura.
O chefinho deles, que não
manda porra nenhuma porque é um boboca leitoso, agora no RS é o Mr. Boate Kiss.
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