sábado, 29 de junio de 2013

Depois da Rede Globo e do moralismo


Por Alex Moraes (pescado do Outras Palavras)


A grande jogada da mídia corporativa brasileira foi ter conseguido nacionalizar a seu bel prazer os protestos que vinham ocorrendo em diferentes cidades do país há meses. Nacionalizar no sentido de apresentá-los como algo que, supostamente, expressava um conjunto difuso e generalizado de insatisfações. A infiltração da Rede Globo na convocação dos protestos abriu as portas das ruas para a mesma classe média moralista que, há pouco mais de meia década, apoiada pela retaguarda oligárquica, tentara promover uma onda golpista contra o governo de Lula.

O relativo êxito inicial da estratégia da rede Globo e de todos os grandes jornais do país nos obriga a pensar na enorme contradição representada pela atual estrutura midiática e nos seus efeitos nefastos quando se trata de reivindicar o aprofundamento da democracia e da participação popular. Referida contradição pode expressar-se nos seguintes termos: do ponto de vista administrativo, o Brasil possui um arraigado federalismo caracterizado por enormes singularidades políticas locais; do ponto de vista social e cultural, o grau de articulação dos movimentos populares, suas redes de alianças e suas demandas — assim como os impactos específicos do capitalismo desenvolvimentista — mudam de forma substantiva em cada região ou localidade.

No entanto, continuamos expostos a um sistema de informação hiper-concentrado sob todos os aspectos (geográfico, econômico, político). Não podemos sobrevalorizar o papel das mídias alternativas e das redes sociais nesse contexto. Sua capacidade de desbloqueio da informação e de produção de outros pontos de vista é ainda bastante limitada — mesmo que crescente — e não joga um papel decisivo sobre a informação de massas.

Interpelados pela escalada conservadora, os movimentos sociais mais representativos articularam uma contra-ofensiva. Convocados por João Pedro Stédile (do MST), reuniram-se em São Paulo na semana passada para estabelecer princípios gerais de articulação. Saíram do encontro comprometidos com pautar as manifestações de rua e estabilizar um conjunto de demandas sintonizadas com os processos de luta historicamente gestados no campo popular: reforma agrária, reforma urbana, reforma política, ampliação radical dos investimentos em educação pública, etc. Na primeira grande manifestação desta semana, ocorrida segunda-feira, em Porto Alegre, os efeitos da presença progressista se fizeram notar: “Que paguem os ricos” dizia a enorme faixa à frente da marcha. Detrás dela era possível divisar dezenas de bandeiras de partidos políticos da esquerda, de sindicatos, e grupos libertários. Não estiveram ausentes as críticas abstratas à corrupção e algum ufanismo, mas sua capacidade de expressão reduziu-se bastante em comparação com situações anteriores.

Os grandes meios de comunicação omitem, mas o conflito entre esquerdas e direitas está posto nas ruas. Ele é um dos elementos dinamizadores do debate político em torno aos protestos atuais. Não seria demasiado otimismo afirmar que a cooptação midiática fracassou em seus objetivos estratégicos iniciais. A disputa de ideias está aberta e o debate ideologizou-se à revelia do hino nacional e das bandeiras verde e amarelas. Esta emergente batalha de ideias complexifica bastante o cenário atual. Por um lado, é necessário disputar nas ruas a hegemonia sobre as marchas, pois ali se encontra a única esfera pública massiva ao alcance da ação política transformadora. Por outro lado, é preciso levar adiante um esforço interpretativo que nos permita recolocar os termos do diálogo e das reivindicações. Para cumprir com o segundo objetivo, devemos começar desmontando alguns “a priori” paralisantes, instilados pelos discursos midiáticos na análise do processo político vigente. 

Os dois tópicos seguintes são uma contribuição neste sentido.

1) Os protestos não se espalharam do centro para o resto do país.
Esta é a interpretação típica dos grandes jornais e vem sendo comprada por alguns jornalistas de esquerda, como Eric Nepomuceno, que faz a cobertura da situação no Brasil para o jornal argentino Página 12. Para as grandes redes de televisão com sede em Rio e São Paulo não resta a menor dúvida de que as coisas se deram mais ou menos assim: poucos milhares saem às ruas num dia e sofrem forte repressão policial; jornalistas são agredidos; as marchas se massificam e o resto do Brasil copia. Qual o risco de adotarmos tal ponto de vista? Podemos cair na armadilha das “demandas difusas”, do gigante recém-desperto e confuso que precisa ser “aconselhado”. Perdemos, então, nossa capacidade de auto-enunciação, de falar por nós mesmos. Basta ter um pouco de boa vontade para constatar que, pelo menos desde o ano passado, vicejam lutas sociais em todas as grandes cidades brasileiras. Tais lutas denunciaram muitas das mazelas que, hoje, são escancaradas nas manifestações multitudinárias. A crítica dos impactos violentos das obras da Copa sobre a vida das classes populares tem sido difundida de forma constante e progressiva pelos Comitês Populares da Copa; a “higienização” das cidades e a privatização dos espaços públicos também foi o eixo de outros tantos protestos, como a derrubada, em vários pontos do Brasil, do mascote da Copa do Mundo. 

Em Porto Alegre, por exemplo, a “queda do Tatu Bola” em 2012 desatou uma repressão policial indiscriminada com direito a quebra de câmeras fotográficas e agressão física de vários jornalistas. A respeito do preço dos transportes, o Movimento Passe Livre e outros blocos de luta estavam nas ruas desde muito antes das recentes manifestações em São Paulo. Estes coletivos, formados por estudantes secundaristas e universitários, já haviam conseguido reverter o aumento da passagem em diferentes cidades, algumas delas capitais. Naturalmente os processos sociais têm seus ápices de expressão e isto depende de vários fatores conjunturais. A violência policial em São Paulo, muito visibilizada midiaticamente, sem dúvidas facilitou a difusão nacional das demandas por melhorias no transporte coletivo. Não é possível dizer, contudo, que a posterior “interiorização” dos protestos consistiu em mera cópia do movimento paulista. Seria mais pertinente pensá-la como a proliferação de demonstrações públicas de solidariedade que souberam aproveitar-se do momento favorável para veicular propostas políticas locais. Claro, as classes médias “globalizadas” também deram as caras; mas sem conseguir opacar o caráter visceral e o potencial transformador que os protestos deixavam antever.

2) Não existe um “movimento nacional”. Trata-se da emergência conjunta de exigências específicas, localizadas e por vezes conflitantes.

Não estamos defrontados com uma espécie de “corrente nacional”, algo do tipo “todo o Brasil deu a mão”. Esta é a visão daqueles que não vivem cotidianamente as mazelas e clivagens excludentes engendradas pelos contextos urbanos brasileiros; é o ponto de vista de determinado setor da classe média completamente desprovido de um discurso crítico, arraigado em contradições sociais concretas. Para essa classe média, é muito fácil negligenciar as demandas locais e falar da “nação descontente”, como se se tratasse de um coletivo abstrato, unificado em torno de algumas exigências supostamente gerais, mas que na verdade só descrevem o limite de consciência e imaginatividade característico dos grupos dominantes. Quando contingentes significativos da população aproveitam o atual momento de visibilidade pública das ruas para denunciar a violência policial, exercer participação social, sinalizar os limites do sistema representativo atual e exigir, ao fim e ao cabo, dignidade, não estamos falando de coesão, mas sim de contradição. Estes são sintomas de diferenças irreconciliáveis no marco da presente ordem econômica e política. Desmontar a falácia de “um só povo” (a “cadeia nacional”) e resgatar a profundidade das consignas enraizadas na experiência vivida de pessoas concretas demanda que regressemos ao nível local, às nossas próprias cidades e bairros em busca daquilo que foi suprimido pelo discurso midiático em seu afã por nacionalizar — e cooptar — o descontentamento popular.

A democracia brasileira está sendo reaberta a cotoveladas no meio de uma chuva de bombas de gás. Só seremos povo, só poderemos falar em “todos nós” quando — para retomar a consigna zapatista – o acesso à cidadania for generalizado, quando tenhamos incorporado na vida pública aquelas experiências de sociedade, aqueles sofrimentos e angústias cuja relevância política encontra-se postergada. A primeira grande vitória discursiva dos setores populares nestes protestos foi ter deixado bem claro que as “vozes das ruas” precisam ser escutadas antes das vozes do poder econômico estabelecido. Agora trata-se de enunciar necessidades e urgências em termos transformadores, definir quais são essas vozes e quem é o “povo”, evitar a domesticação do discurso, negar as soluções fáceis que só reiteram o poder das instituições de sempre, sem jamais colocá-las em xeque a partir de outras formas de imaginar o futuro.

A grande jogada da mídia corporativa brasileira foi ter conseguido nacionalizar a seu bel prazer os protestos que vinham ocorrendo em diferentes cidades do país há meses. Nacionalizar no sentido de apresentá-los como algo que, supostamente, expressava um conjunto difuso e generalizado de insatisfações. A infiltração da Rede Globo na convocação dos protestos abriu as portas das ruas para a mesma classe média moralista que, há pouco mais de meia década, apoiada pela retaguarda oligárquica, tentara promover uma onda golpista contra o governo de Lula.

O relativo êxito inicial da estratégia da rede Globo e de todos os grandes jornais do país nos obriga a pensar na enorme contradição representada pela atual estrutura midiática e nos seus efeitos nefastos quando se trata de reivindicar o aprofundamento da democracia e da participação popular. Referida contradição pode expressar-se nos seguintes termos: do ponto de vista administrativo, o Brasil possui um arraigado federalismo caracterizado por enormes singularidades políticas locais; do ponto de vista social e cultural, o grau de articulação dos movimentos populares, suas redes de alianças e suas demandas — assim como os impactos específicos do capitalismo desenvolvimentista — mudam de forma substantiva em cada região ou localidade. No entanto, continuamos expostos a um sistema de informação hiper-concentrado sob todos os aspectos (geográfico, econômico, político). Não podemos sobrevalorizar o papel das mídias alternativas e das redes sociais nesse contexto. Sua capacidade de desbloqueio da informação e de produção de outros pontos de vista é ainda bastante limitada — mesmo que crescente — e não joga um papel decisivo sobre a informação de massas.

Interpelados pela escalada conservadora, os movimentos sociais mais representativos articularam uma contra-ofensiva. Convocados por João Pedro Stédile (do MST), reuniram-se em São Paulo na semana passada para estabelecer princípios gerais de articulação. Saíram do encontro comprometidos com pautar as manifestações de rua e estabilizar um conjunto de demandas sintonizadas com os processos de luta historicamente gestados no campo popular: reforma agrária, reforma urbana, reforma política, ampliação radical dos investimentos em educação pública, etc. Na primeira grande manifestação desta semana, ocorrida segunda-feira, em Porto Alegre, os efeitos da presença progressista se fizeram notar: “Que paguem os ricos” dizia a enorme faixa à frente da marcha. Detrás dela era possível divisar dezenas de bandeiras de partidos políticos da esquerda, de sindicatos, e grupos libertários. Não estiveram ausentes as críticas abstratas à corrupção e algum ufanismo, mas sua capacidade de expressão reduziu-se bastante em comparação com situações anteriores.

Os grandes meios de comunicação omitem, mas o conflito entre esquerdas e direitas está posto nas ruas. Ele é um dos elementos dinamizadores do debate político em torno aos protestos atuais. Não seria demasiado otimismo afirmar que a cooptação midiática fracassou em seus objetivos estratégicos iniciais. A disputa de ideias está aberta e o debate ideologizou-se à revelia do hino nacional e das bandeiras verde e amarelas. Esta emergente batalha de ideias complexifica bastante o cenário atual. Por um lado, é necessário disputar nas ruas a hegemonia sobre as marchas, pois ali se encontra a única esfera pública massiva ao alcance da ação política transformadora. Por outro lado, é preciso levar adiante um esforço interpretativo que nos permita recolocar os termos do diálogo e das reivindicações. Para cumprir com o segundo objetivo, devemos começar desmontando alguns “a priori” paralisantes, instilados pelos discursos midiáticos na análise do processo político vigente.

Os dois tópicos seguintes são uma contribuição neste sentido.

1) Os protestos não se espalharam do centro para o resto do país.

Esta é a interpretação típica dos grandes jornais e vem sendo comprada por alguns jornalistas de esquerda, como Eric Nepomuceno, que faz a cobertura da situação no Brasil para o jornal argentino Página 12. Para as grandes redes de televisão com sede em Rio e São Paulo não resta a menor dúvida de que as coisas se deram mais ou menos assim: poucos milhares saem às ruas num dia e sofrem forte repressão policial; jornalistas são agredidos; as marchas se massificam e o resto do Brasil copia. Qual o risco de adotarmos tal ponto de vista? Podemos cair na armadilha das “demandas difusas”, do gigante recém-desperto e confuso que precisa ser “aconselhado”. Perdemos, então, nossa capacidade de auto-enunciação, de falar por nós mesmos. Basta ter um pouco de boa vontade para constatar que, pelo menos desde o ano passado, vicejam lutas sociais em todas as grandes cidades brasileiras. 

Tais lutas denunciaram muitas das mazelas que, hoje, são escancaradas nas manifestações multitudinárias. A crítica dos impactos violentos das obras da Copa sobre a vida das classes populares tem sido difundida de forma constante e progressiva pelos Comitês Populares da Copa; a “higienização” das cidades e a privatização dos espaços públicos também foi o eixo de outros tantos protestos, como a derrubada, em vários pontos do Brasil, do mascote da Copa do Mundo. Em Porto Alegre, por exemplo, a “queda do Tatu Bola” em 2012 desatou uma repressão policial indiscriminada com direito a quebra de câmeras fotográficas e agressão física de vários jornalistas. A respeito do preço dos transportes, o Movimento Passe Livre e outros blocos de luta estavam nas ruas desde muito antes das recentes manifestações em São Paulo. Estes coletivos, formados por estudantes secundaristas e universitários, já haviam conseguido reverter o aumento da passagem em diferentes cidades, algumas delas capitais. Naturalmente os processos sociais têm seus ápices de expressão e isto depende de vários fatores conjunturais. A violência policial em São Paulo, muito visibilizada midiaticamente, sem dúvidas facilitou a difusão nacional das demandas por melhorias no transporte coletivo. Não é possível dizer, contudo, que a posterior “interiorização” dos protestos consistiu em mera cópia do movimento paulista. Seria mais pertinente pensá-la como a proliferação de demonstrações públicas de solidariedade que souberam aproveitar-se do momento favorável para veicular propostas políticas locais. Claro, as classes médias “globalizadas” também deram as caras; mas sem conseguir opacar o caráter visceral e o potencial transformador que os protestos deixavam antever.


2) Não existe um “movimento nacional”. Trata-se da emergência conjunta de exigências específicas, localizadas e por vezes conflitantes.

Não estamos defrontados com uma espécie de “corrente nacional”, algo do tipo “todo o Brasil deu a mão”. Esta é a visão daqueles que não vivem cotidianamente as mazelas e clivagens excludentes engendradas pelos contextos urbanos brasileiros; é o ponto de vista de determinado setor da classe média completamente desprovido de um discurso crítico, arraigado em contradições sociais concretas. Para essa classe média, é muito fácil negligenciar as demandas locais e falar da “nação descontente”, como se se tratasse de um coletivo abstrato, unificado em torno de algumas exigências supostamente gerais, mas que na verdade só descrevem o limite de consciência e imaginatividade característico dos grupos dominantes. Quando contingentes significativos da população aproveitam o atual momento de visibilidade pública das ruas para denunciar a violência policial, exercer participação social, sinalizar os limites do sistema representativo atual e exigir, ao fim e ao cabo, dignidade, não estamos falando de coesão, mas sim de contradição. Estes são sintomas de diferenças irreconciliáveis no marco da presente ordem econômica e política. Desmontar a falácia de “um só povo” (a “cadeia nacional”) e resgatar a profundidade das consignas enraizadas na experiência vivida de pessoas concretas demanda que regressemos ao nível local, às nossas próprias cidades e bairros em busca daquilo que foi suprimido pelo discurso midiático em seu afã por nacionalizar — e cooptar — o descontentamento popular.

A democracia brasileira está sendo reaberta a cotoveladas no meio de uma chuva de bombas de gás. Só seremos povo, só poderemos falar em “todos nós” quando — para retomar a consigna zapatista – o acesso à cidadania for generalizado, quando tenhamos incorporado na vida pública aquelas experiências de sociedade, aqueles sofrimentos e angústias cuja relevância política encontra-se postergada. A primeira grande vitória discursiva dos setores populares nestes protestos foi ter deixado bem claro que as “vozes das ruas” precisam ser escutadas antes das vozes do poder econômico estabelecido. Agora trata-se de enunciar necessidades e urgências em termos transformadores, definir quais são essas vozes e quem é o “povo”, evitar a domesticação do discurso, negar as soluções fáceis que só reiteram o poder das instituições de sempre, sem jamais colocá-las em xeque a partir de outras formas de imaginar o futuro.

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Que solo estoy

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Chegando... si, llegando, de Bujumbura, en el bar veo la gran cantante Nina Moreno, a rainha de Porto Alegre seria, para mim e muitos outros é, não fosse os nazistas das redes que só visam lucro de péssimo gosto. 

Mania de ir mudando de assunto. Mas isso um dia vai acabar.

Me dice Nina querida que le gusta más este tango. 

Luzes de sua mocidade. Por alguma razão o tango entra em mim. Solidão por solidão, vieja, estamos mano a mano.

Nina de muitas luzes, ela parece e é uma menina ao viajar al pasao. Uma menina de 85 anos? Por aí? Pois é, moça, eu a sinto com 30, ao vê-la cantar.

Sabe, Nina, outra noite o João me contou uma, tá, sei que não conheces o João, mas me contou que um amigo dele, o Lucas da Azenha, bem mais velho, lhe disse: "O meu falecido filho me dizia pai a mudança se houver virá pelas redes sociais, o babaca a fez para promover trepadas mas perdeu o controle, pai, agora ele fatura, surpreendido mas aguçado para tomar grana do povo mais e mais, firmas, propagandas em música até ruim empurrada na gente, mas o que vai sair dali... pai, dali é que virá a mudança... E Lucas da Azenha, o boêmio que não bebe, murmurou minha vida meu amado meu guri meu tudo, e chorou.

Mania de ir mudando de...


A música é de Raúl Kaplún e a letra de Roberto Miró. Em 1944.

Vai com Adrian Duval.

Pra ti, Nina.




Si al sentir que te perdía,
si al saber que te quería
cómo te dejé partir.
Si al partir tu te llevaste
a mi alma hecha pedazos
y a mí nada me dejaste
para no sufrir así.
Hoy que el tiempo ya ha pasado
y que sólo me ha dejado
amarguras y dolor.
Yo quisiera verte un día
y tan sólo demostrarte
como vivo desde entonces,
sin consuelo y sin amor.

Solo...
espantosamente solo,
apurando en la copa de la vida
el sinsabor.
Pena de arrastrar esta condena
que me mata y que me quema
este triste corazón.
Frío...
de sentir adentro mío
primaveras perdidas
y que ya no volverán.
Miedo de saber que solo quedo,
días nuestros que se fueron
y ya no retornarán.

Si encontrase en mi sendero
un amor que me salvara,
pero cómo habrá de ser.
Si ya todo es agorero,
si Dios quiso que te amara
y no quiere libertarme
del tormento de querer.
Andaré por los caminos
en un viaje por las sombras,
que me alejarán de ti.
Y las voces que te nombran
se unirán a mi destino
anudando mis angustias
hasta el día de morir.


miércoles, 26 de junio de 2013

Um sonho lindo, n'A Charge do Dias

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Bar lotado, os empinantes dispostos a torcer pelo Uruguay. Esse é o lado sádico dos boêmios, só para ver a cara dos otários que vão oferecer a bunda - e a grana - para os ricaços encarregados do circo, como argumentam.

- Vocês são é uns recalcados -, disse Silvana Maresia.

Carlinhos Adeva cai de joelhos em sua frente:

- Obrigado, amada, nunca recebi tamanho elogio. Neste mundo, vendo o que se vê diariamente, a escravidão, os filhos da puta enriquecendo com o sangue dos que não tiveram chance, o cara que não é recalcado é anta.

O jogo começa e a tevê do botequim transmite sem som, ninguém aguenta "os pulhas dos narradores, alguém tinha que dar um tiro nesses caras, para pararem de iludir cumprindo ordens", como disse Gustavo Moscão. Silvana fica encarregada de avisar se alguém fizer gol, enquanto os demais seguem de papo e tentando acompanhar pela internet a evolução dos protestos em Belo Horizonte.

Em certo momento o Contralouco levanta-se e diz alto:

- Declaro solenemente que sou contrário a essa história de depredar contêineres de lixeiras. Com tanto banco por aí...

E vai para o salão da sinuca.

Papo vai e papo vem, o filósofo Aristarco de Serraria, com os olhos balançando por muitas dyablas verdes que entornou, propõe uma mudança no modo de protestar:

- Chega de trancar ruas, encher os centros das cidades de gente, isso ajuda os bandidos a cometerem assaltos. Vou sugerir à moçada algo muito mais econômico: que simplesmente destrua o Congresso Nacional e enforque os nobres parlamentares. Pronto. Convoca-se nova eleição, os caras que forem eleitos vão pensar cem vezes antes de meter a mão.

- Seria o ideal, mas Brasília fica muito longe, a gente ficaria na dependência do povo de lá -, ponderou Tigran Gdanski.

- Concordo. Tem que acabar com aquele antro. É mais fácil fazer de novo do que tentar consertar algo que não tem conserto, fica esse problema da distância -, disse Jezebel do Cpers.

- E quem iria enforcar a rataiada, a gurizada? -, questionou Jussara do Moscão.

De lá da sinuca ouviu-se a voz do Contralouco: - Eu! Deixa comigo! Isso não é trabalho, é prazer.

E seguiram assim, combinando detalhes do novo protesto.

Aqui pensamos em lembrar que isso é coisa de gente que não tem o que fazer, mas o pessoal é lúdico. Tomam uns tragos e ficam sonhando acordado com coisas maravilhosas, pegar na loteria, em ser herói, enforcar bandidos que condenam seres humanos à degradação ou à morte. A realidade é muito diferente, quem tem a força são eles: possuem os meganhas e as comunicações. Enfim, sonhar ainda é permitido, bar é bar.

Escolheram as obras do dia.

Nani



 Passofundo.



Paixão.



Amâncio.



Miss Leila, a coordenadora da coluna, ficou com o Sinovaldo.



A coluna A Charge do Dias leva esse título pelo seu idealizador, o mestre Adolfo Dias Savchenko, que um belo dia se mandou para a Argentina, onde vive muito bem. Sucedeu-o na coordenação a jovem Leila Ferro, filha do Terguino, quando os boêmios amarelaram na hora de assumir o encargo. Antes eram dois butecos, o Beco do Oitavo e o Botequim do Terguino, que.., bem..., se fundiram  no ano passado (veja AQUI), face a dívidas com o sistema agiotário. O novo bar manteve o nome de um dos butecos: por sorteio ficou Botequim do Terguino, agora propriedade dos ex-endividados António Portuga e Terguino Ferro.

domingo, 23 de junio de 2013

Mocotó no botequim, n'A Charge do Dias

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A culinária do Botequim começa a recepcionar o inverno. Hoje o Portuga vai atacar de sopa de mocotó, está desde cedo diante do enorme panelão, na folga do cozinheiro Rodrigues ele mesmo mete a colher. Hummm, deu água na boca. O Contralouco queria churrasco, se dependesse dele sairia churrasco todos os dias, mas a turma optou pelo mocotó do lusitano. Ausente Luciano Peregrino, que ontem viajou com destino ignorado, dizendo que ia sumir do mapa.

E aí saiu o primeiro buquimequi: quanto tempo Luciano ficará fora. A opção mais apostada foi 30 dias, que foi o tempo que levou na última vez que trocou de namorada. O Contralouco marcou por último: 7 dias. Naquela vez voltou com uma espanhola de tirar o chapéu, Dolores Sierra, bonita e viçosa. Aí saiu o segundo buquimequi: a etnia da próxima. Bruno Contralouco abriu apostando numa angolana, desconfia-se que pelos papos que andou levando certa vez com o Luciano. As professoras Jezebel, Jussara e Silvana cravaram alemã, no que foram acompanhadas pela Leilinha, pelo Portuga e pelo Terguino. Zilá ficou com uma italiana e Clóvis Baixo com uma japonesa. O resto da turma veio lá do salão da sinuca e foram em peso na angolana do Contralouco, sabem que o boêmio não prega prego sem estopa. As mais votadas foram a angolana, com 14, e a alemoa, com 6.

Depois ficaram bebericando e preenchendo os cartões para o bolão da Loto de São João. Noventa milhões é muita grana para um só caminhãozinho, então jogaram todas as fichas no bolão, para aumentar as chances e não precisar andar cercado de seguranças depois, todos detestam leão de chácara. O Luciano deixou a sua grana com o Contra antes de viajar, dizendo aqui ó que eu fico fora dessa, quero ver a cara da espanhola quando eu estiver com 3 ou 4 milhões na mão. João da Noite levou a grana aqui da palafita, também estaremos participando, para dar uma reforçada no caixa. Por falar em leão e em caixa, pena que a Caixa Federal fique com a parte do leão, para ser entregue ao governo e para os políticos desviarem depois.

Pelo notibuc da Leilinha souberam e festejaram a fuga autorizada do Edward Snowden de Hong Kong, os chineses não quiseram entregá-lo ao império do Obama Darth Vader. Snowden foi o cara que dedurou a espionagem eletrônica cometida pelo império em todo o mundo, onde o Google e o Facebook também se enredaram. Um negócio mais grave que os documentos que o soldado Manning entregou ao Wikileaks. O cara vai se asilar em Havana ou Moscou, ufa, suspiraram todos aliviados, se o pegam fariam picadinho dele, embora seguro nunca mais estará, vão persegui-lo pelo resto da vida. Lá é assim, dizer a verdade dá morte. Para o jovem Manning querem dar prisão perpétua. 

Outro buquimequi, agora para o escore de Uruguai x Taiti e Espanha x Nigéria. No primeiro a opção mais votada foi 12 a 0 para a celeste. No segundo jogo a coisa preteou, a maioria deu vitória da Nigéria por 2 a 1. Chupim da Tristeza resumiu o pensamento do pessoal: 

- Com aquele futebolzinho de salão dos espanhóis, toquinho pra cá, toquinho pra lá, volta, toquinho de novo, eles tem mais é que sifu, ganharam do Uruguai por culpa do técnico uruguaio, que escalou mal e demorou para mexer, e ainda assim com um gol contra e outro em flagrante impedimento.

E chegaram, por fim, às obras do dia, e aqui estenderam-se em comentários sobre os protestos. Gustavo Moscão abriu mandando o governador de Minas Gerais tomar naquele lugar. Jussara do Moscão soube que o intelectual Senor Abravanel, vulgaríssimo Sílvio Santos, disse que protesto sobre tudo é protesto sobre nada, pelo que também mandou-o tomar naquele lugar, eta família unida. No embalo Marquito Açafrão também mandou o presidente da FIFA e o Ronaldão das Travecas tomarem bem dentro. A doutora Jezebel do Cpers estranhou que haja pessoas que estejam responsabilizando a Dilma por tudo, diz que não é bem assim, nessa dos ônibus, por exemplo, a maracutaia é entre prefeituras e empresas de ônibus. 

A turma foi ao protesto de quinta-feira em Porto Alegre e salvo o Contralouco ninguém teve problemas com os meganhas. Sobre o problema é melhor deixar para lá para não alertar os gansos.

Tigran Gdanski, após confabular com Nicolau Gaiola e Walter Schiru numa mesa do fundo, encaminhou o pedido de que recordemos o seguinte: todos os motivos que hoje levam o povo às ruas vem há anos sendo martelados incessantemente pelos chargistas do Brasil. Não tem dia em que não se vislumbre pelos jornais e blogs o registro silencioso em suas páginas. Registro silencioso é força de expressão: é um grito ensurdecedor. De modo que, desde o botequim, vai o agradecimento aos grandes defensores da democracia e de uma vida melhor a todos os brasileiros, com muitas escolas, boas escolas.

Escolheram as seguintes obras dos artistas do traço e do pensamento.

Santiago. De vez em quando o grande artista aparece, para felicidade geral dos boêmios.



Jorge Braga. No entender dos companheiros este indivíduo, não o Jorge Braga, claro, e sim o Lulaluf, em parte é o responsável pela fuzarca, com a sua política de coalizão de pássaros, entre estes alguns urubus, com ratos. Aristarco disse que talvez um dia venha a ser elogiado por isso, por sem querer ter apressado as mudanças.



J. Bosco. O Sr. Bruno Contralouco comentou a obra: - Matou a cobra e mostrou o pau!



E o Thomate.




Miss Leilinha Ferro ficou com o Nani, trazendo outro bicho horroroso.



A coluna A Charge do Dias leva esse título pelo seu idealizador, o mestre Adolfo Dias Savchenko, que um belo dia se mandou para a Argentina, onde vive muito bem. Sucedeu-o na coordenação a jovem Leila Ferro, filha do Terguino, quando os boêmios amarelaram na hora de assumir o encargo. Antes eram dois butecos, o Beco do Oitavo e o Botequim do Terguino, que.., bem..., se fundiram  no ano passado (veja AQUI), face a dívidas com o sistema agiotário. O novo bar manteve o nome de um dos butecos: por sorteio ficou Botequim do Terguino, agora propriedade dos ex-endividados António Portuga e Terguino Ferro.

sábado, 22 de junio de 2013

Adeus, Dolores Sierra

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Hoje Dolores Sierra me telefonou de Barcelona. Para romper. Eu quase pedi que não. Quem não vê cara não vê coração, mudando o lero, lei desta vida de sangues, gritos e fezes. 

Mandei recado, pedi que me ligasse, vou pagar a ligação. Eu respeitoso, a custo controlando o nervosismo, não podia ligar, poderia estar ocupada. A gente pensa nos problemas da pessoa, imagine ligar numa hora em que está cercada de bandidos e com desconfiança dos guardas que a protegem, São Paulo é fogo e ela não é uma moça atendente de padaria de luxo, mesmo estas meninas andam ali, patrão de olho. Ela corria risco de vida. 

Veio com o lero de sempre: não quero mais, nunca gemi contigo, os passeios de mão foi porque eu estava dando um tempo até vir o cara lindo de carro que eu gostava, foi um tempo bom que agora acho que foi ruim. E caprichou na insistência: não pense que tenho alguém, não tenho, só trabalho, mal tenho tempo de tomar banho. 

Certo, entendido. Nada perguntei, mas não me insulte a inteligência.

Entendi mesmo, e ao entender lembrei de uns vinte boleros.

Que deus que não existe me ajude, pois estou falido, sem ninguém, amigos sumiram há anos, cortam esquina, agora não por doença e sim pelas dívidas. Viajarei sozinho para longe, mas me deu uma coisa. Eu com fé perdida há muito tempo pela destemperança e egoísmo e ciúmes de gentes..., ah, sei lá, de gentes, não a pobre deusa azul que precisa de barba e promessas de... sei lá, viver, homem perto, grana nunquinhas, deus nos livre, ela não é assim.

Ela é de fé, sinceridade, não a encontrei se oferecendo por aí. Precisa respirar somente, vida ruim exaure as defesas da pessoa, tadinha, precisa ser feliz, seja lá o que signifique ser feliz.

Ao ensopar o travesseiro, envergonhado de mim mesmo dos soluços, gritos, meu Deus, os vizinhos..., de repente me lembrei. A gente supera horrores e depois esquece, em defesa inconsciente guardando aquela marca num cantinho do cérebro, aqui ninguém toca.

Lembrei-me, sim. 

Lembrei-me que ainda menino de 21, maltrapilho em ruas, bibliotecas e hospitais, os horrores, a luta para não entregar os pontos así no más, quantos desejos de namoros de longe, as moças dançando frenéticas as músicas da moda, norte-americanas, eu imaginava fossem inteligentes, puxa, que beleza, e não umas coquetes frívolas. Nunca me olharam. Ainda bem. E lembrei que sobrevivi e acabei em outras camas, lindas, queimando a minha vida em fumaças de cigarro com formas de mulher.

Dolores era diferente. Eu gostava dela, tanto, tanto. Gostava nada, gosto ainda. Eu queria me casar com ela. Mas a distância, o gavião calçudo... amoroso, sim, querida, te entendo, aí, meu irmão, me fodi do primeiro ao quinto.

Ela entregou os pontos ante a adversidade, e por exigência da febre pela distância. E mente, defesa Petrov comum. Entendo.

Nunca me amou, provado está, o que não é defeito, talvez tenha tentado comigo por falta de tu vou de a pé contigo mesmo. Não perdeu nada, pois de fato sou um boboca, sonhos, igualdade, passeatas, desmontando, lubrificando e montando a arma para matar em sonhos o congresso nacional, e ela lá, lubrificada e muito longe, a distância complica lubrificação, e eu apavorado, queria... mas a passagem é cara e o desgosto dos infantes egoístas é fatal.

Daí que dei de lembrar do passado, da mesma fumaça em forma de mulher. Daquele amanhecer, a moça me abraçando à janela da rua Santo Antônio, dizendo sabe guri, estou aqui porque tenho um menino, queria tanto que você fosse mais velho para me tirar, e eu respondendo no dia em que eu puder sair te levo.

Lembrei-me, sim, que foi na adversidade que me tornei caravana.

Um dia volto da longa e tortuosa viagem.

O bolero é de um elepê que uma das minhas irmãs perdeu enquanto eu morria. Meu querido disco da meninice, eu que colecionava antiquos originais que ninguém queria, servem pra nada, a moda é rock. 

Ora, meu, não pense, tome uma cerveja, anda arrumar a mala, tu disse que um dia volta.

Luciano 










viernes, 21 de junio de 2013

Inverno de esperanças

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Ao contrário de alguns anos anteriores, neste entramos o inverno esperançosos, por tudo o que vimos no outono que acabou. Ainda ontem as ruas do Brasil com milhões de pessoas, os mudos gritos de Chega!, os que se apropriaram de tudo ouviram, ah, desta vez ouviram, e se alguém não ouviu iremos de novo, na próxima com mais gente... Há muito mais que o primeiro movimento.

Inverno é parte de As Quatro Estações, um conjunto de 4 concertos para violino, de 1723.

É a obra mais conhecida de Antonio Lucio Vivaldi (Veneza, 4/3/1678 - Viena, 28/7/1741). Vivaldi, o padre ruivo, é outro que morreu na pobreza, vale a pena ler a sua biografia.





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jueves, 20 de junio de 2013

Vem pra rua, vem!, n'A Charge do Dias

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"Hoje não haverá o traguinho de fim de tarde no botequim, às cinco a turma estará se dirigindo para a frente da Prefeitura, coisa de dez minutos a pé. Vão mais cedo - o horário marcado é 18 h - para dar uma espiada nas imediações, dos meganhas tudo pode-se esperar. Um fato é por demais cristalino, transparente: no Rio Grande do Sul, como nos demais estados, o governador não tem a menor autoridade sobre as polícias civil e militar, como seu Secretário de Segurança também não, por óbvio. Na militar, então... Dizem uma coisa, governador ou secretário, e a tropa assente, atenciosa, compreensiva, sim, tudo entendido, o senhor tem razão, em seguida saem fazendo chacota do patrão eleito e agem de modo oposto, batendo, humilhando e escarnecendo de pessoas de bem, como na ditadura, quanto à arrogância e brutalidade, mas agora, ao contrário daquela, desobedecendo ordens da mais alta hierarquia. São Paulo é um caso à parte, o governador é um troglodita igual aos militares, a diferença é somente o seu berço de ouro e a Opus Dei. Remember Carandiru, nada mudou na tropa.

Bem, vão cedo também para ter tempo de pintarem o rosto junto à moçada das tintas, na marcha pela redução do preço das passagens, quem sabe comprar uma fita verde-amarela para amarrar na testa. Também vou nessa, claro. Estamos rezando para que o Senhor dê coragem a certos políticos, os representantes dos analfabetos funcionais, isto é, representantes de si mesmos, pois adoraríamos encontrá-los por lá. O Contralouco queria se fantasiar de vendedor ambulante e levar os molotovs do finado Hyde numa carrocinha falsa de cachorro-quente, foi um parto dissuadi-lo da idéia. Ficou resmungando, perguntando o que deve fazer, então, se os gorilas começarem a atirar em quem nada fez de errado, só com a adaga não dá para enfrentar bombas. Outro parto, agora para lhe retirar a adaga. Diz o Portuga que ele está desde às nove entornando dyabla verde, puto da cara, teve um momento em que foi às lágrimas, repetindo os meninos vão nos salvar, imagine um homem de 35 anos chorando às dez da manhã em frente a um liso de losninha, mas que não quis abrir o que foi que lhe aconteceu, o Portuga acha que é rabo de saia, com o Contra sempre é rabo de saia, mas sei não.

Como sabes, Salito, os amigos raramente tomam ônibus, pois todos moram e trabalham na Cidade Baixa, mas vão em solidariedade à massa (que em sua maioria não irá), e também para gritar a plenos pulmões o que pensam dos vermes da política e dos ricaços que com políticos no escuro do vão da escada enriqueceram em abjeta conjunção, vendo seus irmãos privados de tudo à luz do dia, na mais triste escuridão sob o rebenque, lobotomizados sob o reflexo da tela azul dos larápios das tevês mal havidas, quando não sob os berros de aiatogélicos de araque, sem saúde e educação, pobre povo, diariamente explorado por canalhas de todos os matizes."

Assim começou o recado escrito às pressas por Luciano Peregrino, quando encaminhou as charges do dia a este blog. A concentração será às 18 h, em frente à Prefeitura.

Após as charges, emendou ainda: "Bruno Contralouco manda um recado para o pessoal do protesto de Brasília: 'Se algum amigo entrar por bem no Congresso e encontrar um político, dê-lhe uma porrada por mim, bem no meio da cara, se eu estivesse aí quebraria sozinho esse prostíbulo'. Nicolau pede para que alguém trate de empalar o Feliciano Galinha Louca. Gustavo Moscão avisou: 'Que ninguém me toque no Renan Calheiros, ele é meu!'. Em seguida Tigran Gdanski foi no embalo e lascou um recado aos paulistas: 'Digam para o presidente do PT que vá tomar bem dentro daquele lugar, ele que tente erguer bandeira na marcha para ver, a passeata não é lugar para políticos de merda, menos ainda para mensaleiros'. Aí todos queriam mandar recados semelhantes, desliguei o notibuc dizendo que tinha enguiçado, de outro modo eu ficaria até amanhã aqui escrevendo. 

Os ânimos se acalmaram com a chegada de João da Noite, o futuro prefeito de Porto Alegre, que disse que se for para fazer arruaça é melhor que todos fiquem no bar, já chega os louquinhos que saem para depredar o patrimônio do povo. Olhou para o Contralouco e disparou: 'Viu, Sr. Bruno, passeata para reclamar é como enfrentar o trânsito, sempre tem um desguampado que foi corrido de casa ou traído pela mulher, ou qualquer problema íntimo, e precisa descontar em alguém, aí já viu, em qualquer manobra malfeita chama o motorista do outro carro de corno, e sabemos como termina, imagine agora centenas de pessoas em precárias condições psicológicas num espaço apertado. Todo cuidado é pouco'. O Contra riu e respondeu: 'Ah, agora ele virou psicólogo, mas eu não sou corno, não', mas entendeu a mensagem.

De minha parte, eu gostaria mesmo era de estar no Rio, pra ver as caras dos espertos Cabral Guardanapo e Eduardo Paespalhão, amiguinhos atrás das moitas do Lula".

Aqui na palafita gostaríamos somente que o Lula, agora Lulaluf, e seus mensaleiros ficassem atentos à televisão, para ver o que conseguiram com a sua ignóbil putaria de coalizão. Forçoso reconhecer que, pelo resultado oposto ao esperado, parece que enfim esses politicalhos acabaram fazendo um bem ao Brasil. Em 15 dias o povo botou abaixo todo o seu papo furado, escancarando a escravidão imposta pelos múmios que eles, com 54 milhões de votos, tiveram medo de enfrentar, preferindo aderir às práticas dos criminosos.

Hoje pela manhã, pelo que soubemos, pouco depois das onze, à exceção do Contra, os boêmios passaram no bar somente para a escolha das obras, que aí vão:

Laílson. Aqui, observa Luciano, parece, só parece, que o artista retratou o probo Renan Calheiros e uma frívola agronegociante chamada Kátia. Ah, e que faltou a guilhotina...



Erasmo.



Duke.



E Lila.



A coordenadora Leilinha também escolheu uma obra do Duke.




A coluna A Charge do Dias leva esse título pelo seu idealizador, o mestre Adolfo Dias Savchenko, que um belo dia se mandou para a Argentina, onde vive muito bem. Sucedeu-o na coordenação a jovem Leila Ferro, filha do Terguino, quando os boêmios amarelaram na hora de assumir o encargo. Antes eram dois butecos, o Beco do Oitavo e o Botequim do Terguino, que.., bem..., se fundiram  no ano passado (veja AQUI), face a dívidas com o sistema agiotário. O novo bar manteve o nome de um dos butecos: por sorteio ficou Botequim do Terguino, agora propriedade dos ex-endividados António Portuga e Terguino Ferro.

Lucro nas empresas de ônibus e prejuízo no serviço público

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Ontem à noite, depois do absurdo de a Itália vencer um jogo onde levou um baile dos japoneses, o principal assunto no botequim foi novamente o silêncio dos políticos quanto ao lucro das empresas concessionárias de transporte público, lucro nada, lucrão, tema já abordado outras vezes pelo boêmio Carlinhos Adeva, que só fala nisso (ver Passagem comprada e Como baixar o preço da passagem).

- O negócio é impressionante, chega a ser ridículo, os caras falam, falam, e nunca um piozinho sobre os lucros das empresas de ônibus, é um super tabu. O que dizem é que pedirão redução de tributos para essas empresas, isto é, vão tirar da nossa grana, que deveria ser aplicada em escolas ou hospitais, por exemplo. Deveria, porque o normal é gastar em inutilidades como esse montão de estádios de futebol, tudo obra superfaturada, por alguma razão, como todos sabemos, os políticos se relacionam maravilhosamente com empreiteiras e outros bichos -, disse, pela vigésima vez, o Dr. Carlinhos.

- E a imprensa não pergunta sobre os lucros, nem uma perguntinha de nada, coisa estranha... - disse com ironia Aristarco de Serraria, o filósofo da turma.

- Pode ser despreparo dos jornalistas, são despreparados mesmo -, sugeriu a professora Jezebel do Cpers.

- Vai atrás -, disse Clóvis Baixo - o Carlinhos já pediu que algum jornal ou revista faça um levantamento, primeiro pelas capitais e grandes cidades, para começar. 

- Pergunto de novo: quem são os donos das empresas, pessoas físicas? Qual, quanto, pombas, foi o lucro líquido de cada empresa, antes do pro-labore e das participações, ano a ano, só dos últimos dez anos? Exorbitância, filme de terror, ou apenas um lucrinho legal? Quem examinou as contas, dando-lhes fé? Planilhazinhas é conversa mole, cadê os balanços? Quanto desse lucro foi acabar, direta ou indiretamente, no bolso dos sócios ou acionistas, seja como pro-labore, lucro/dividendo ou juros sobre o capital próprio? - estrilou Carlinhos, vermelho de bravo.

- O poder público deveria disponibilizar essas informações, afinal vivem falando em transparência -, disse Jussara do Moscão.

- Transparência um caralho, nem sob tortura os políticos ousarão entrar nessa fria, fazem de conta de que isso não existe, as concessionárias são entidades de outro planeta. Algum motivo devem ter para isso... -, afirmou Tigran Gdanski.

Luciano Peregrino explodiu em sonora gargalhada, dizendo: - Dá para imaginar o motivo... Os recursos não contabilizados!

- O que é isso, tio Luciano? - perguntou inocentemente a Leilinha de lá detrás do caixa.

- O peéfe, amadinha.

Voltaram ao futebol. Os que assistiram aos dois jogos da quarta-feira tornam a reclamar da televisão do botequim. Não do aparelho, e sim do fato de só pegar canais abertos. Foram muitos a opinar, mas resumimos a ópera. É impossível suportar o áudio da Band e da Globo, dá engulhos, o pessoal acaba perdendo o tesão pelo jogo, pois sem áudio também fica meio chato, é bom ouvir o urro da massa. É que ninguém aguenta o Luciano do Vale e o Galvão Bueno. Outro desastre são os comentaristas, não sabem porra nenhuma,  a moçada fica se perguntando quem os colocou lá, serão parentes do dono? Ressalvaram, quanto aos comentaristas, o Denilson e o Casagrande, esses sabem o que dizem, mas com os narradores juntos nem com boa vontade. Enfim, narradores e comentaristas tornam o espetáculo uma merda.

Tigran Gdanski diz, dirigindo-se ao Terguino e ao Portuga, donos do botequim:

- A gente poderia assinar uma tevê a cabo, né?

- E quem vai pagar o assalto da mensalidade?, pergunta o Portuga, um tanto encabulado.

- Quanto ao futebol seria trocar seis por meia dúzia, pelo que sei - aparteou Jucão da Maresia.

Então o Terguino tomou a palavra:

- Pessoal, desculpem mesmo, de há muito deveríamos ter tevê a cabo, para eventos como futebol e espetáculos musicais, pelo menos ali no salão da sinuca. A verdade é que o bar vai de mal a pior, estamos duros e devendo. Ainda hoje eu pretendia informar que a cerveja vai subir, de cinco para seis pilas. A pizza seguirá a doze paus, também não mexeremos nos demais comes e bebes, até vermos se a cerveja poderá cobrir o preju. Como vocês sabem, ali na Rua da Olaria não se acha bar onde a cerveja custe menos de oito, isto se acharem por oito, e os comes então... Se subirmos todos os preços, isto aqui vai virar bar de colas-finas, como os da Olaria. 

Embargou a voz. 

A sincera confissão doeu no coração dos boêmios.

Terguino continuou:

- Não queremos lesar os usuários do serviço, abrindo mão da presença de vocês. Enfim, não desejamos mudar o perfil da clientela, cola-fina é muito afetado, reclama de tudo. E, afinal, nunca mais veríamos os amigos de tantos anos, isso não vamos permitir de jeito nenhum.

Clóvis Baixo, até então quieto, pediu licença para falar.

- Ora, vamos pensar numa solução, isso já aconteceu antes, com os dois bares, antes da fusão (Aqui). De pronto me ocorre que botequim é uma instituição nacional, gênero de primeira necessidade, o bom brasileiro não vive sem o seu. Merece a consideração das autoridades, mesmo que não seja um serviço público devidamente reconhecido pela burocracia do quem pode mais chora menos. Além de promover o congraçamento dos amigos, a alegria de batuques e violões, também acolhe lágrimas vertidas por culpa daquela pessoa ingrata, e muitas outras sensíveis situações em nossas vidas, não se pode permitir o triste destino da falência, distanciando pessoas, rompendo amigos do peito e de bar. Afinal, o botequim está com prejuízo comprovado, o Terguino e o Portuga mostram os números para quem quiser ver, e não anda fraudando licitação nem sustentando políticos por baixo dos panos, com recursos não contabilizados na origem e no destino. Assim, obviamente que o primeiro passo, que é o que proponho, é pedirmos aos governos a desoneração da folha de pagamento dos empregados, bem como a isenção de tributos municipais, estaduais e federais.