domingo, 29 de noviembre de 2015

Vodka com laranja

.
A propósito de uma placa de boteco anunciando seus produtos, repassei ontem no facebook por diversão de gosto duvidoso, que muitos - eu também - acharam que é montagem, tal o número de erros de português (começava com peichi frito), ao ponto de, mesmo eu que defendo qualquer grafia se o conteúdo for compreendido, lembrei de uma.

Claro, defendo qualquer grafia nas circunstâncias de nosso povo, onde muitos sofrem demais... vocês sabem, pois a padronização do vernáculo é um mal necessário, de outro modo os estrangeiros jamais nos entenderiam, entre outras razões também cruciais.

No falecido Bar do Nadir, ali na Zé do Patrô, perto da igreja e em frente a um posto de combustíveis, éramos muitos os boêmios, tinha a turma da gilete - lindos travestis, estes todos queridos amigos que respeitavam, nada de frescura com meu chapéu, etc., e mesinhas de sinuca nos fundos, ali quando o Pato ou eu pegávamos no taco todos se amontoavam para assistir, bons de cesta e de domínio de branca. Acho que escrevi longamente no blog sobre isso.

Bem, teve época em que o sucesso era vodka com suco de laranja espremida na hora, e gelo picadinho. Não sei por que diabos chamavam o coquetel de Hi-Fi.

Ao anoitecer, todos os santos dias, o Nadir colocava o placão lá na frente: "Temos de tudo, até RAIFAI".

*


Modernidade sem gesso

.
A modernidade é boa, mas por vezes me assusta.

Certa vez eu tinha que assinar um depoimento na sede do FBI da Cidade Baixa. Rato me dá azia, e eu precisava de cinco dias antes de ficar de mal para sempre com uns caras que assaltaram um banco, pois nesse meio tempo viriam as "provas" que os livrariam.

Eu que planejei o assalto, fui junto, era o cara de capuz amarelo que chefiava, mas pegaram um otário que entregou o pouco que sabia, era um babaca, nunca viu a minha cara.

Enquanto o Janjão encaminhava o apagamento do indivíduo liguei pruma enfermeira do hospital Ernesto Dornelles e ela me livrou a cara: tapou meu braço direito de gesso, desde a mão, no tempo em que era aquela pasta misturada com bandagens.

Dei uma testada no espelho para me ferir, dei muito forte e abriu um lejo, levei dez pontos, e pronto, fui lá todo arrebentado: os senhores me desculpem, passou uma patrola por cima de mim, não posso assinar. Com a esquerda não consigo, não serve nem pra me masturbar.


Deu tudo certo. Fosse hoje tava frito, os ratolinos veriam que o braço e a mão estavam bons.


sábado, 28 de noviembre de 2015

Meninas

.
Saí do Rio de Janeiro espavorido, por um problema com uma branquinha minha num colégio de velhas não fodidas. Larguei tudo. Eu estava num assunto grave entre ladrões financeiros, ficaram apavorados, onde vai? Para o Galeão mas não demoro.

Eu volto, esperem, não saiam daqui, antes de meia-noite volto.

Fui lá, peguei o primeiro avião para Porto Alegre, enquanto a menina estava saindo de lá do colégio peguei os boletins em casa, ela veio e eu fui, não me viu. A senhora diretora não queria me atender, e isso que eu estava bem vestido, terno azul marinho, camisa azul clarinha, o fino, e gravata vermelha.

Quando falei em chamar advogados a velha me recebeu. Educadamente mandei-a enfiar onde quisesse o boletim que uma maluca deu pra minha menina. E joguei em cima da mesa duzentos boletins, dois enormes sacos cheios, fui tirando e atirando na mesa: Ou me mentiram em duzentos, ou este lixo está errado, ou tu quer, senhora, discutir este assunto na Justiça Federal?

Voltei para o Rio de Janeiro no vôo das 19:30h do mesmo dia, depois de dizer a eles todos, nessas alturas tinham chamado advogados, que se a minha menina sonhasse que estive ali eu rasgaria o Acordo de paz, fiz constar no acordo.

Um mês depois uma junta médica disse que a moça profa era louca, exonerada. Exagerados. Avaliaram, contrataram, e me vêm com essa de louca? Fase ruim, momento ruim na vida, deu azar comigo sem me ver, mas não agrediu nem insultou a minha branca, algum vagabo a transtornou. até que fez uma observação ruim no boletim.

Prometi a mim mesmo, quando voltasse a Porto Alegre, procurar a professorinha, e assim fiz. No fim das contas salvei duas meninas, uma de 9 e outra de 21.

Fiz jus aos meus 33, que diziam ser a idade de Cristo.

*

(A imagem é da interrnet, como mera ilustração, no caso um menino indo para um mundo diferente, com aquele friozinho na barriga).


viernes, 20 de noviembre de 2015

Casadas

.
Ontem à tarde eu assistia ao vivo a sexta ronda do embate de países europeus. Resolvi acompanhar Shirov (Letônia) x Perunovic (Youguslávia). O campeão mundial, o jovem Magnus Carlsen, jogava em outro tabuleiro contra o húngaro Leko, mas fiquei com Shirov, para entender a decadência do grande campeão, que de há muito vem de má fase.

Aí me entrou um site de Encontros que não pedi, algum vírus, mas não era maldoso, dizendo-se diferente, que não era tipo Badoo, cheio de hipocrisia, aqui é para trepar mesmo, ninguém quer lero-lero de compromisso.

Ah, é? Filme antigo, mas resolvi encarar para ver a quantas andamos.

Desliguei o nóti, acionei atualização do come-vírus e comecei tudo de novo.

Digitei o site casadasprocuram.com e caí dentro. Isto vai dar uma história, no mínimo, pensei, e de repente algumas percantas casadas, se os maridos são ruins merecem as guampas, se pintar aqui na zona, hummm...

Meia hora preenchendo a ficha, análise e tal, email cheio de xyz, nome de José do Punhal Quente, e quando as mulheres estavam quase na mão o site pediu foto.

Botei uma foto do Contralouco. O Contra é bem apanhado, e naquela foto de chapéu na chuva, as luzes da rua pegando de lado, come até as freiras e noviças do Vaticano. Sorry, Chicão.

Começaram a chegar dezenas de convites de aí gostoso, só jacaré.

Putz, me arrependi, pensei, acho que vou ligar pro Contra, caso ele queira ficar com a inscrição. 

Acabou ali a minha história, já tive problemas há dez anos com o Par Perfeito, queria me processar por uma história de alemoa, e de lá para cá não mudou grande coisa.

Liguei e contei. Ele riu:

- Não se preocupe com a foto, Sala, já tenho registro nesse e em mais uns dez. Aliás, outro dia me inscrevi no Kisme, putaria pior que esse das Casadas, e botei a tua foto, aquela que tá bonitão na escadaria do Beco da Fonte.

Vou matá-lo hoje à noite.


Shirov e Carlsen venceram.

*

A Máfia de Branco

.
Recebi essa imagem, sem fonte, sem autor, mas imagino quem sejam. Quedei-me perplexo pela perfeição, 90% redondos. Consta que são uns zés-cus em João Pessoa que divulgam, aqueles que enquanto brincavam de bonecas eu já era um homem morto há 50 anos. A ONU, aquela que só acerta míssil em hospital de crianças sírias, patrocinou a propaganda de Unidades brasileiras inexistentes na prática.

Lembrei de algo de muito sofrimento na minha vida.

Eu fiz esse exame de HIV certa vez, não sabia o que tinha, história comprida, quase dei nos médicos, fiz todos os exames do mundo. Pagando caro.

Até esse de AIDS (SIDA). Tinha perdido dez quilos e os moleques dos médicos, essa tropa de criminosos, diziam sorrindo tu não tem nada rapaz, vai pra casa, vai pra festa.

Eu hein? Por não ser analfa me salvei. Se eu não conheço o meu corpo um merdinha filhinho de papai desses mercenários iria conhecer...

Para o último, um velho canalha, eu fui arrogante: seu sujo, então eu perco dez quilos sem mudar hábito algum, comida, e tu diz que não tenho nada? Um dia volto aqui para te dar um tiro, se eu tiver.

Depois com outro fiz o de AIDS e mais cem exames, abri o resultado sozinho num canto de laboratório pago, trêmulo, sem ninguém saber, família nem sonhava, vai que... Tudo Negativo. Ufa.

Depois de meses, uma luta sem fim, pela minha insistência, após passar por mais vinte viados médicos de merda, esperas, pagando na frente em dinheiro vivo, laboratórios, descobri: câncer no intestino.

Um médico de coração acertou de gato ao pedir um exame de coração. Mais meio ano e estaria morto. Descobri no inverno de 2007.

E agora, quanto custa para um pobretão, não é o meu caso (remediado apenas, mas armado) na tal UBS? Onde estão essas UBS? Eu não sei.

Cadê a propaganda maciça da CEF, do BB, etc, nisso, em vez de sustentarem times de futebol, salve Mengo, e políticos gatunos, empresariões, dar o do povo para miaus planos de saúde falcatrua e tal?

Vou pra Cuba? Não, vou ficar aqui mesmo. Se acontecer de novo saberei como lidar com essa máfia. Vou, mas os levo.

Pois o pior ainda estava por vir, quando topei com os assassinos de hospitais, a um avisei, o cirurgião chefão deslumbrado: se esta merda retornar tu morre. ele esqueceu de me dar aquela coisa química para coibir retorno.

Meses depois uma médica especialista empalideceu na minha frente, quando lhe contei. Relutou, mas menti que não tinha parentes e ela acabou entregando: eu tinha 20% de chances de sobreviver. E isso que paguei tudo à vista, e caro.


Aguentei no osso do peito por anos a fio.

*

Depois de tudo, la Envidia

.
Peguei um nojo, em certo aspecto, mesmo aqui neste bar, da envidia. Sei como se diz em português, mas em espanhol me parece mais cruel, como sempre foi. Só o que vi na minha vida, la envidia, logo seguida pela ingratitud, era para ter morrido de desencanto.

Sou eu e a minha vida. Nem santo nem diabo, menos ainda no luxo, e nem estou, como nunca estive, "me achando", como disse um imbecil que foi amigo de infância, há 48 anos, e nunca mais me viu, nem quis ver, se soube o que passei não se apresentou para dividir um prato de comida, se ele o tivesse, e o tinha.

Burgueses são vocês, diria a esses senhores imitando Martinho, eu não passo de um pobre coitado.

Quando eu, entre outros abobados, entre estes muitos religiosos sem interesse algum a não ser ajudar, nada a ver com pastores da tevê e tipinhos assim, esses criminosos, e sim gente de bem, eu longe deles, cada um na sua, não falo com religiosos, eles que me procuraram depois de me ver muitas vezes lá dentro, ã, visitava o Asilo Padre Cacique, os velhos disputavam quase a tapa: é o meu filho que veio, outro gritava não, é o meu. Ao nos olharem viam suas filhas e filhos.

Eu, não sei as outras almas que lá iam, tava ganhando bem, só ia levar umas coisinhas pros velhos esquecidos, bater um papo no pátio, duas ou três horas em dias de visita. Como vai, minha mãe, melhorou? Meu pai, o guarda parou de lhe importunar? Vou botar uns cigarros no seu bolso, olhe pro outro lado.

Acabávamos dizendo a todos, Sim, meu pai, sou o Carlos. Sim, minha mãe, sou o Roberto. Eu vim lhe ver, como no mês passado.

E as "creches" muquifas de crianças pequeninas abandonadas, e os presídios onde a maioria roubou um bombom ou uma galinha?

Eu não hesitaria em queimar com tiro no rosto 3/4 do Congresso Nacional, que o povo elege a cada ano abaixo de grana, povo corrupto, classe média desgraçada, mas não posso. Se todos nós, que somos poucos, fizermos isso, depois de nos matarem eles colocarão os desvalidos e abandonados em câmaras de gás.

Esses caras que abandonam os seus em asilos ou onde seja, e esquecem, não merecem ser chamados de humanos.

Ah, história comprida demais. Aqui não é o lugar.

Conheço os abandonadores, outro dia conto o tipo e classe social que faz isso. Outro dia nada: é a maldita classe "mérdia". Os ricos miau não fazem porque não precisam, os pobres não fazem porque a pobreza os une.


Por essas e outras me chamam de Contralouco.

*
Breve relato da ilustração (wikipedia):
Jeroen van Aeken, cujo pseudônimo é Hieronymus Bosch, e também conhecido como Jeroen Bosch ('s-Hertogenbosch, c. 1450 — 9 de Agosto de 1516), foi um pintor e gravador Holandês dos séculos XV e XVI.
Muitos dos seus trabalhos retratam cenas de pecado e tentação, recorrendo à utilização de figuras simbólica complexas, originais, imaginativas e caricaturais, muitas das quais eram obscuras mesmo no seu tempo.

lunes, 16 de noviembre de 2015

Caiu o sinal pela centésima vez

.
Desprezado Sr. Virtuoso Combo Net

Pensei em mandá-lo tomar bem dentro do orifício anal, seu filho de uma pu... - deixa a mãe de lado -, porém lembrei que o senhor gosta disso, não vou enviar algo bom, e seria preconceito com a opção sexual dos outros, por mim que o senhor continue de suruba com cinco armários de seis portas enquanto sonha com o Kid Bengala.

Digo apenas então, seu filho de uma pu... - deixa a mãe de lado - que vou lhe dar um tirinho na cara, não, tirinho não, tive uma ideia melhor. Meus bugres - na carteira profissional têm "Segurança de arremetida" - já estão a caminho, todos com automáticas de última geração, mas mandei Kafil, o executor, usar um facão.


Boa noite pra mim, a sua será diferente, seu filho de uma pu... - deixa a mãe de lado. Hoje estou sem sinal, amanhã o senhor terá sumido sem deixar vestígio, como a sua net, de sua passagem pela face da Terra.

*

Pecado

.
A cada vez que ouço Piazzolla recordo de uma mulher, linda morena, índia de um metro e sessenta e cinco, a Mauda. Eu já com a vida melhorada, terno e gravata, apartamento pago, chapéu na cabeça, viagens pelo país, muita mulher, música... e ela me achou.

Eu morava no Alto da Bronze e ela, depois de anos me procurando arrependida, conseguiu me encontrar. Fui doce inicialmente, mas ela encontrou outro, não mais aquele menino que morava numa pensão e não tinha o que comer.

Para me agradar, depois de passar a noite me tirando o leite de todas as maneiras, como se fosse a última vez, comprou dois ingressos para um show. Ingressos disputadíssimos, custando os olhos da cara, para vermos o argentino e seus homens de preto no Teatro São Pedro, em Porto Alegre, na época lá só entrava abonados, selecionados pelo preço. Fui lá algumas vezes, mas detesto aquele lugar.

Não gosta por recalcado, me disse certa vez uma cantora, ao que tranquilamente concordei. Acrescentei: neste mundo de mentira e morte o sujeito que não é recalcado é muito burro ou filho da puta.

Um ano depois, ou dois, ou algo assim, no inverno austral de 1992, ele morreria, não tive segunda chance de assisti-lo ao vivo.

Briguei com ela por uma antiquíssima peça teatral que me aprontou, quando eu era um mulambo de rua e ela, cheia de posses e pretendentes, me mentiu, eu, hein? Disse-lhe algumas verdades, controlei-me para não enforcá-la no varal do pátio, e rasguei o meu ingresso. Até hoje não sei se ela foi ao show, no seu ingresso não toquei, só cuspi.

Saí, me bebi e acordei pela manhã lá longe no bairro Cristal, nos braços de uma nega que nunca tinha visto na vida.


Que pecado. E não um só, tremo por dentro ao dizer com todas as forças da minha alma, que desejo que ela, a querida mulher da minha vida, morra sarnenta e fedida, eu sabendo que dentro do meu coração jamais consegui me libertar do seu amor. Maldita, me mentiu, e me ensinou que não sei perdoar.


*

Guri-bomba

.

Amanhece no Oriente. O menino de doze anos sai para buscar água na fonte a um quilômetro de casa, sua mãe disse ontem, era a sua vez. 

Lá na fonte se dobra e enche o primeiro cântaro. Começa a encher o segundo e uma explosão o estremece, derruba o pote na fontezinha.

O lado de onde veio o barulhão fez algo se acender em seu cérebro, um temor, não pode... Larga tudo e volta correndo para casa, sôfrego, mal respirando. Já a cem metros um medo terrível o toma, as pernas ameaçam amolecer mas segue firme em velocidade.

Quando chega não tem mais casa. Tem um buracão. Foi-se a casa, a mãe, o pai, as duas irmãzinhas. Uma bomba dos Estados Unidos levou tudo. Vê o tio, que correu antes vindo do outro lado, desconsolado com as mãos no rosto.

O que ele fará, logo que tiver idade para tanto?

*



domingo, 15 de noviembre de 2015

A branca do Inter (1)

.
Em pleno sábado à tarde o deputado do DEM arranjou uma reunião para conversar com os comparsas sobre uma maneira de entregar a Fundação Zoobotânica aos amigos da especulação imobiliária. Saiu às três dizendo que voltava antes das nove.

O telefone tocou, peguei um táxi e fui lá fud... ã, conversar com a sua esposa, uma loira muito piranhona, pra casar com ele só podia, né. Precisei de apenas meia hora para desmanchar a onça, virou uma sopa. Entre ida e vinda demorei duas horas, cheguei às cinco. Voltei com mais três mil no bolso.

Fui de burro, pervertido, pois prefiro petesudas solteiras, essas direitosas são cheias de nhén-nhén-nhén.

Voltei e começaram os meus problemas: me bati atrás da minha camiseta branca do Internacional de Porto Alegre, e nada de achar. Achei duas rubras do Colorado, mais três do amado Peñarol, mas a branca neca pau.

Enquadrei as tiangas: "Todas já lá pra sala, reunião de família". Sentei no meio do sofá grande, cruzei as pernas, copo de uísque na mão, elas nervosas, sentiram que vinha esporro feio. Enfileiradas em pé, só de calcinha. Jacira de Uruguaiana pelada total, com aquele montão de bombril preto à mostra, chamei-lhe a atenção: "A senhora poderia vestir uma calcinha como as outras, sua despudorada?". Saiu em disparada buscar um paninho.

Até os felinos da casa, Gatolino e LF, se perfilaram no meio delas. Mariana de Rosário do Sul, a índia que em 99 eu trouxe da Serra do Caverá, ainda menina de 19 anos, a única que se permite vir de gracinhas devido à minha complacência, sou louco pela bugra, disse desaforada: "Quer que a gente bata continência também, querido general Salito?".

Dia destes a atiro pela janela.

(segue)


viernes, 13 de noviembre de 2015

O Rio que era doce

.
Autoria e direitos de Moema Leite. Colhi em rede social e publico sem autorização da autora, em caso de discordância removo imediatamente.

Mais que um grito, um libelo diante do horror cometido por seres sem sentimentos.


Morreu o lugar que eu nasci,
Morreu meu cavalo
Meu cachorro e minha história;
O que eu tinha de mais bonito,
Agora, só na memória.
O peixe virou cimento;
E a igreja, e a escola?
Nem sino, nem movimento!
Sobrou nada da plantação!
Nenhum quadro na parede;
Nada prova que sou José,
nada diz que sou João;
Enlameados documentos,
Soterrados com crianças
E adultos sem esperança;
Acabou-se a minha Bento;
Chorou Elvira, retratando o fato,
que cortou seu coração
Mas choro não limpa o rio,
Nem devolve a vida ao chão...
Correu longe o leito de morte
Uma lama sem distinção,
Cobrindo os sonhos de todos
Matando a paz e a mansidão
E o Rio, que era doce até então,
Hoje, Vale nada não!

*

miércoles, 11 de noviembre de 2015

Fruta pode roubar, hortaliça não

.
Meus amigos porto-alegrinos por adoção, como os adotivos de outras paragens, hão de entender meu saudosismo.


Há pouco fui dar uma espiada na Mercearia Zaffurtari, como faço diariamente. Não compro nada, só confiro a evolução da gatunagem nos preços. Vou na hora do pico, quando sempre encontro misturados aos clientes os caras que vão bater algo furtivamente. Torço pelos caras, não raro lhes dou uma piscadinha e digo ao passar: "Vai firme, malandro, que ajudo a dar cobertura com o corpo".

Normalmente são três, um bate e dois cobrem as câmeras com o corpo. Tem incontáveis maneiras de desviar a atenção dos guardas e das câmeras, mas aqui não vou entregar a rapadura.

Tive um amigo, o Paulino, este agia sozinho, que todas as noites de inverno levava algo por dentro do sobretudo, uísque, vinhos caros, salmão, etc, nas mãos umas coisinhas baratas. Certa vez o flagraram por um buraco de observação que tinham colocado na parte superior da Mercearia. Enquanto não passar no caixa eles nada podem fazer, e foram na saída, logo que passasse o caixa seria preso.

Malandro é malandro: passou os baratilhos que iria pagar e um sentimento estranho o invadiu, algo no ambiente não o agradou, como nos contou depois. Então olhou para fora e viu os caras olhando para ele. Tirou tudo dos bolsos internos e depositou atrás de si, dizendo: "Achei que tinha dinheiro, moça, mas esqueci em casa a carteira, por favor mande recolocar nos respectivos lugares". E saiu rindo dos cinco trouxas que o aguardavam.

Esta mania de ir mudando de assunto ainda vai me botar na cadeia. Voltando ao saudosismo: fiquei morto de vontade de voltar para a cidade onde vivi até os 20 anos. Lá a gente tinha de tudo de graça: hortaliças e frutas. Se alguma não tivesse no pátio da gente, tinha no do vizinho.

Na minha casa a gente tinha abacate, bergamota, laranja, limão e lima. Na casa do padrinho Jofre Vargas tinha ameixa vermelha e amarela, romã, goiaba, mais laranjas e tudo. Na casa do Pato Martins mais um monte de cítricos. E assim por diante. O que não tivesse, como banana, a gente roubava em pomares longínquos. Por alguma razão só se afanava frutas, poucas para comer na hora, sem culpa; hortaliça não, jamais, que aí o cara seria ladrão.

Nos fundos da casa do Pato tinha uma enorme propriedade coalhada de árvores frutíferas, mas o velho era brabo. Atirava de espingarda com chumbinho na gente, então íamos nos arrastando na hora da sua siesta. Certa vez ele armou pra nós e não dormiu, quando vimos se veio lá de dentro atirando. Foi guri espavorido para todo lado, eu errei o caminho e fui parar na casa do Biba, lá longe perto de um colégio de onde fui expulso. Que susto. Hoje penso que era festim, mas na época...

Pois hoje vi na Zaffurtari umas romãs inchadas de agrotóxicos por R$ 40,00 o quilo, uma três ou quatro dá um quilo. Em reais o equivalente a vinte quilos de arroz. Dei mais uma volta e passei de novo por onde estavam, esbarrei num gordo e caí em cima das romãs, que se espalharam por toda a Merceria, foi o meu acidental protesto, que também foi a deixa para umas figuras lá do outro lado se avançarem nas mercadorias enquanto todos olhavam para cá.

Nessa Mercearia muito me diverti antigamente, desde uns 30 anos. Eu chegava, muitas vezes de viagem, ainda de terno e gravata, todo sério, comprava algo e dizia para o/a caixa: "Moça(o), tou chegando de viagem, de uma reunião de empresários no Rio de Janeiro, sabe o que o dono daqui disse, para explicar porque tudo é tão caro? Porque paga demais para os funcionários". Todos os funcionários por perto ouviam, e se olhavam. Uns riam, outros ficavam puto com o dono. Eu sempre serião.

Tanto fiz que minha cabeça andava à prêmio, a notícia chegou ao dono e seus aspones, queriam saber quem era o cara que andava envenenando a moçada. Fiz isso em todas as filiais. Nunca me pegaram. Se pegassem repetiria e diria mais na cara deles, eu era ruinzinho, mas não deixei me pegarem por pura diversão.

O que me salvou a tarde foi que andando pela Cidade Baixa encontrei o mestre Santiago Neltair Abreu, o artista que já é patrimônio cultural da cidade e do estado. Santiago é homem novo, do tipo que nunca envelhece, sempre jovem, serelepe, e não perde nada, tem corrida. Para se ter uma idéia, ele recentemente recusou a indicação para patrono, xerife, da maior feira do livro da América, a nossa, de Porto Alegre. Ambos apressados, mas tivemos tempo para levar um lero rápido, sorrisos e um abraço.

Na volta comprei algumas cervejas no armazém do Nelson e vim para casa escrever estas mal-traçadas. 

Amanhã irei novamente lá na Zaffurtari.

*



lunes, 9 de noviembre de 2015

MUTIRÃO DE BUNDAS - Loterias da CEF, a maldosa picaretagem

.
Na dureza em que ando, e necessitando de muito café no bule para montar um novo harém, fui fazer uma fezinha numa lotérica. Bem, montar não, aumentar. Preciso muito de mais uma mineira, mais uma paulista, mais uma carioca, mais uma capixaba, e as que serão as primeiras piauense e amazonense. E três gaúchas que estão doidas para dormir nos meus pelegos. Assim fecharei em trinta e cinco o plantel. Epa, trinta e seis, ia esquecendo a linda moça do Pará, que está por aqui com aquela vida, bela e confiante que quer vir pro Sul. Fechado.

Com volantes na mão e anúncios à vista perdi alguns minutos fazendo cálculos de cabeça. Não vale a pena aprofundar os cálculos posto que a essência salta à vista. O problema não reside exatamente nos cálculos.

O problema é a deslealdade dos nossos governantes desde que inventaram a tal loteria para enxugar os bagarotes do povo. É a má-fé, é a desigualdade. É a premeditada injustiça.

Por exemplo, na Mega Sena é possível se marcar de 6 até 15 números para acertar os 6 do prêmio principal. Se marcando 6 custa R$ 3,50, marcando 15 custará 17.517,50, o preço aumenta de acordo com as possibilidades matemáticas de acerto, e o sujeito que marca 15 tem 5.005 vezes mais chances de acertar que o infeliz que marcou 6. O que marcou 6 tem uma chance em 50.063.860, o que marcou 15 tem uma em 10.003.

Vem o cara que tem dinheiro frio, pois roubou da Petrobrás, ou levou bola dos Planos de Saúde, ou tomou do mesmo povinho em templos de falsidade, etc., e joga cem cartões de 15, em combinações feitas por computador: pronto, vai a quase noventa por cento de chances de acertar, ou seria mais, não calculei, importa aqui é o substrato da sacanagem.

Esquenta a pecúnia mal havida, quem não lembra do canalha do João Alves? Tá cheio de políticos nesse bolo.

Quer dizer, para um pé-de-chinelo honesto como eu e 99% da população brasileira, só se nascer com um vulcão virado para a Lua para ganhar o maior ou ao menos um bom prêmio, somente o fiote virado para a Lua que no céu flutua não adianta.

E por aí vai a jogatina toda, em todas as modalidades, Loto, Timemania, Lotomania, Chupomania, Miaumania, Fácil não sei o quê, etc.

São feitas para os ricaços ganharem. Claro, mesmo que o governo abocanhe a maior parte da grana arrecadada, é dinheiro para amansar a vida de qualquer um, dá para montar o harém, comprar uma mansão, se reeleger deputado, investir em operadoras de telefonia, e sobra muito.

Daí que apenas de vinte em vinte anos se ouve falar que uma lavadeira da Bahia pegou na Loto. Nos demais centenas, milhares, de sorteios todos os ganhadores quietinhos, adivinhem quem são?

Em vez de democratizar a jogatina, por que é feito assim, de tirar dos pobres para dar para os larápios?

Seria impossível um modo equânime? Não mesmo, não é impossível, é facílimo: bastaria preço único, tantos números, o mesmo para todos, e uma aposta por cabeça, o número do CPF inserido no cartão de apostas controlaria. O sujeito pode até botar o CPF da família inteira, mas seriam apostas simples, para todos os efeitos os familiares exerceram seu direito de apostar.

Pronto, tudo resolvido. Cairia a arrecadação? Possivelmente, mas o povo apostaria mais, com confiança no seu governo, nas pessoas que dirigem o nosso País, este que estaria respeitando a todos como cidadãos e cidadãs iguais perante a lei.

Seguirão roubando do povo.

Aqui em casa combinei com as mulheres: fizemos cinco apostas de 7 números na Mega, deu 122,50 paus, e no dia do sorteio ficaremos todos pelados com a janela aberta, virados de bunda para a Lua. Pode ser que a estratégia de 28 bundas em mutirão funcione.

Vontade mesmo é de esganar essa gente.

*

miércoles, 4 de noviembre de 2015

Alô, Dilma

.
Pois ontem tomei todas e liguei para a Dilma. O meu amigo Helio certa vez fez pior, de plantão na imobiliária em que trabalhava como agenciador se embebedou e ligou para o Idi Amin Dada, em Uganda, foi um escarcéu, entrou a embaixada do Brasil no meio, um estrago.

A Dilminha é minha amiga particular, embora não fale com ela desde que foi para Brasília, e sou um brasileiro que votou nela, pombas, não teria problema algum.

Ando por aqui de ver o governo acuado, sem um segundo de sossego desde que o zé-bonito, aquele que nunca trabalhou na vida, golpista cuzão, perdeu a eleição junto com os anti-PT. Assim ninguém governa nem bordel.  Resolvi dar-lhe uns conselhos, tipo livre-se desses paulistas de merda e vá para o ataque, menina, cabecear na área deles, pois são mais sujos que pau de galinheiro.

Vou resumir:

- Trim.

- Pois não, segundo-sargento Zenóbio, ao seu dispor.

- Alô, boa noite, segundo-sargento Zenóbio, tu é o homem dos sofismas, hein, cara-pálida, chegadinho numa retórica. Quero falar com a Dilminha. Aproveito para mandar um abraço pro Obama, que está ouvindo esta ligação.

- Quem deseja?

- Salito, de Porto Alegre, sou amigo dela.

Passei meu nome completo, dos pais, avós e bisavós, identidade, CPF, situação matrimonial, etc, e ele disse um instantinho, vou transferir.

- Alô, pois não, primeiro-sargento Zito, ao seu dispor.

- Quero falar com a Dilminha, amigo Zito, jogou no Santos, né? Aproveito para mandar outro abraço pro Obama, que está ouvindo a gente.

Tornei a passar o meu nome completo, dos pais, avós e bisavós, identidade, CPF, situação matrimonial, etc, e ele disse um instantinho, vou transferir.

- Aqui o primeiro-tenente Zózimo, ao seu dispor.

- Seu Zózimo, jogou no Bangu, malandro. Quero falar com a Dilminha. Sou o Salito, anote aí o nome e os documas, os pais e tudo.

- Anotado. Aguarde na linha, senhor.

- Alô, aqui é o capitão Zeferino. Às ordens.

- Puta que pariu, Zeferino, pelo jeito só vou chegar numa porra de general daqui um mês.

Nesse momento a Polícia Federal invadiu meu apartamento, um carteiraço do agente Zeca - tá morando em Xerém, malandro, vida boa -, e fui levado como suspeito de terrorismo.


Isso é coisa que se faça prum companheiro, Zilma?

*

Menos um

.
A maldita campainha aos berros. Fingi que não ouvi. Seguiu berrando. Ao cabo de cinco minutos me levantei contrariado, estava no meio de uma obra-prima aqui.

Espiei pelos buracos da veneziana: um baixote de terno preto lá embaixo. Como pastor da Universal não é, andam fugindo de mim, do Bruno Contralouco e do Gustavo Moscão, pois já quebramos a cara de uns cem desses viados, só restou uma alternativa.

Só pode ser Oficial de Justiça querendo entregar intimação da justa ou me cobrar o que não devo e não vou pagar, aqui não tem nada de valor que possam levar. Reconsidero: é só para entregar intimação, se fosse para roubar meus cacos viria com meganhas junto. Conheço essa racinha.

Vesti-me, botei chapéu e uns óculos escuros enormes. Os vizinhos estão avisados, vão por mim, mas vai que ele tope com o corno do andar de baixo, de vingança por comer a sua mulher periga me entregar.

Desci parecendo o Waldick Soriano, ares de quem vai passear. Meti a chave e abri o portão do meio das grades do prédio e pisei na calçada, quando ele parou de meter o dedo na buzina alheia.

- Bom dia, o senhor mora aqui?

- Não, não moro, tava assaltando um apartamento.

- Ã, desculpe, o senhor sabe se tem alguém no apartamento 701?

- Sei, sou eu. Muito prazer, Carlos Fagundes - e estendi a mão.

- Eu procuro por Antônio Salazar Fagundes, consta que seria neste endereço, é seu parente?

- Meu camarada, essa maravilha de pessoa, um amor de cara, é sim meu parente, primo-irmão, filho do tio Bastião. Só que ele morreu em Manaus há três anos, aliás soube que morreu feliz empernado com umas índias. Posso ajudar em algo?

- Ã, morreu?

- É, morreu, desde então este mundo ficou muito mais pobre, boêmio como aquele nunca mais. Se é alguma herança que o senhor quer entregar procure as filhas dele, mas moram todas no exterior, Alemanha, Macedônia, Egito, Cuba, Burundi... não será fácil encontrá-las. E se o senhor me desculpar tenho um compromisso ali no bar da esquina, até logo.

Menos um pra incomodar.

*