jueves, 6 de agosto de 2015

MORTE LENTA

.
Giuseppe Artidoro Ghiaroni ((Paraíba do Sul, RJ, 22 de fevereiro de 1919 - Rio de Janeiro, 21 de fevereiro de 2008).


Ninguém morre de repente.
Quando dizem que Fulano
faleceu subitamente,
morreu estupidamente,
é engano,
é puro engano!

Pode ser que a ave ferida
ou a árvore abatida
ou a casa demolida
ou outras coisas assim
deixem de súbito a vida
(vida ou coisa parecida),
achando um súbito fim.

Mas quanto aos seres humanos,
nenhum morre de repente.
É um processo inteligente,
lentamente, lentamente,
Leva meses, leva anos.

Leva o tempo em que a viúva
faz a presença do ausente.
A saudade permanente
é um longo dia de chuva.
Lembramos diariamente
o bar que ele freqüentava
os cigarros que fumava,
as coisas que planejava.
Tudo aquilo que era dele
volta à baila noite e dia.
O mundo ficou sem ele
como uma casa vazia.
As canções que ele cantava!
As piadas que dizia!

Passam anos... Cinco... Sete...
Quem ainda se lembrava?
O bar que ele freqüentava
virou uma lanchonete.

As canções que ele cantava
são do tempo do Chalaça.
As piadas que contava
hoje não teriam graça.
O mundo se modifica.
Os cigarros que fumava
Nem a fábrica fabrica.
A viúva, conservada,
Está de novo casada,
E dizem que ficou rica.

Agora sim, falecido!
Agora sim, faleceu!
Anos após ter morrido,
Só – de todos esquecido –
Depois que tudo o esqueceu!


Ninguém morre de repente.
Quando dizem que Fulano
faleceu subitamente,
morreu estupidamente,
é engano,
é puro engano.
Gente morre lentamente,
lenta e dolorosamente,
dia a dia, ano após ano!
.

No hay comentarios.:

Publicar un comentario