martes, 1 de marzo de 2016

A jornalista

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Três da madrugada na boate Batelão, eu lá com um copo de cachaça com vermute tinto, o drink mais barato, entrado de favor, mal-vestido.

Lupicínio Rodrigues conversava com uma nega de cinema de tão bonita numa mesa à direita da entrada, o palco ficava à esquerda.

Eu feliz tomando rabo de galo.

Fiquei mais adiante com os caras que me botaram para dentro, não tinha muito assunto com eles, já estava grato por me pagarem o trago. Um deles me conhecia, o tirei de uma ruim em noite escura.

No palco quem cantava era o sócio do seu Lupicínio, acho que era sócio, Rubens Santos, penso que já tinham sido sócios noutro bar lá pros lados do Gigante da Beira Rio, se não confundo os endereços. Eu tinha vinte anos, e sangue começando as brotar nos lábios, os caninos da raiva despontando, por desapontado com tudo até ali.

Nunca tive dente siso, nisso nasci aleijado.

Eu gostava demais do seu Lupi e do seu Rube, mas jamais tomaria a liberdade de dizer isso pra eles. Imagine, um pobretão falar com os caras. Fiquei na minha no cantinho da mesa.

Entre todas as mulheres presentes, uma me deu uma coisa, um tremor por dentro, não era mulata linda nem dançava bem. Brancona, ares de já vi tudo, dançava uma e voltava rindo para a sua mesa, sem agarro com ninguém.

A turma se animou com a beleza do ambiente e me pagou mais rabos de galo, queriam que bebesse uísque, mas recusei, fico no baratilho para não dar prejú aos camaradas.

A bebida me pegou. Quando vi tinha me levantado, atravessado o pequeno espaço e a tirado para dançar. Por favor, moça.

Ela olhou-me de cima abaixo, riu para os amigos e amigas, e nem se dignou a recusar. Apenas me ignorou.

A gente se engana, e como.

De volta pra mesa, humilhado, um dos caras da "minha" turma disse que a mulher, tinha uns 30 anos, era uma conhecida jornalista, também acionista e porta-voz de uma companhia de seguros.

De jornalismo nem tentei, mas de seguros aprendi tudo, anos a fio. Em cinco anos tomei conta de boa parte da companhia de seguros, sendo gente boa, no fundo queria vingança.

Fiz dela gato e sapato, no último dia bebendo rabo de galo com aquela mesma camisa que guardei suja de tudo, por fim de lágrimas.

Nesse último dia, ela de joelhos, chorando, implorando que eu ficasse, relembrei os tempos passados à dama nua, agora com 45 anos, lembrei-a daquela madrugada no Batelão.

Rastejou pelada, miando, me perdoe, me perdoe...

Saí para morar com uma mulata lá no Morro da Polícia.

Com a mala na mão saí andando pelo bairro de ricaços, espumei pela boca de prazer, enfim vingado.

Pedi demissão da companhia de seguros e fui fazer o que gostava.
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