A
maldita campainha aos berros. Fingi que não ouvi. Seguiu berrando. Ao cabo de
cinco minutos me levantei contrariado, estava no meio de uma obra-prima aqui.
Espiei
pelos buracos da veneziana: um baixote de terno preto lá embaixo. Como pastor
da Universal não é, andam fugindo de mim, do Bruno Contralouco e do Gustavo
Moscão, pois já quebramos a cara de uns cem desses viados, só restou uma
alternativa.
Só
pode ser Oficial de Justiça querendo entregar intimação da justa ou me cobrar o
que não devo e não vou pagar, aqui não tem nada de valor que possam levar.
Reconsidero: é só para entregar intimação, se fosse para roubar meus cacos
viria com meganhas junto. Conheço essa racinha.
Vesti-me,
botei chapéu e uns óculos escuros enormes. Os vizinhos estão avisados, vão por
mim, mas vai que ele tope com o corno do andar de baixo, de vingança por comer
a sua mulher periga me entregar.
Desci
parecendo o Waldick Soriano, ares de quem vai passear. Meti a chave e abri o
portão do meio das grades do prédio e pisei na calçada, quando ele parou de
meter o dedo na buzina alheia.
-
Bom dia, o senhor mora aqui?
-
Não, não moro, tava assaltando um apartamento.
- Ã,
desculpe, o senhor sabe se tem alguém no apartamento 701?
-
Sei, sou eu. Muito prazer, Carlos Fagundes - e estendi a mão.
- Eu
procuro por Antônio Salazar Fagundes, consta que seria neste endereço, é seu
parente?
-
Meu camarada, essa maravilha de pessoa, um amor de cara, é sim meu parente,
primo-irmão, filho do tio Bastião. Só que ele morreu em Manaus há três anos,
aliás soube que morreu feliz empernado com umas índias. Posso ajudar em algo?
- Ã,
morreu?
- É,
morreu, desde então este mundo ficou muito mais pobre, boêmio como aquele nunca
mais. Se é alguma herança que o senhor quer entregar procure as filhas dele,
mas moram todas no exterior, Alemanha, Macedônia, Egito, Cuba, Burundi... não será fácil encontrá-las. E se o senhor me
desculpar tenho um compromisso ali no bar da esquina, até logo.
Menos
um pra incomodar.
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