viernes, 11 de enero de 2013

O gatinho e a Gatona

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Após vasculhar areia e mar, a turma desistiu.

Jezebel do Cpers comunicou: 

- Desculpe, Contra, mas acho que o Gatolino morreu, levado pelas ondas. 

Aristarco, corpo se dobrando para se jogar na onda, parou e voltou até a água pelos joelhos. 

- Isso não é coisa que se diga, Jêze. Só faltou dizer que o Contra matou o pobrezinho.

Ela piscou, apostava que o gato estava vivo, gato é gato, mas Aristarco seguiu de cara fechada, ora. Voltou para o mar e furou a onda, e se foi nadando. Aristarco de Serraria é um peixe.

- Não, agora me lembrei, ele saiu comigo de lá adiante, na volta da rebentação -, disse o Contralouco.

Clóvis Baixo, o tinhoso, vindo de carona com uma ondona, se chegou aqui na água pela cintura, gritando:

- Não morreu nada, roubaram o Gatolino!

E voltou para dentro do mar. Queriam enlouquecer o Contralouco. Ele quieto, sentado na areia molhada, mais sério que capincho, pensando em voz alta.

- Não, não roubaram, ele não vai, e eu mato a pessoa que..., ninguém roubou nada, ele que se perdeu, é novinho, de repente está chegando em Torres a nado. 

E ficou murmurando "não roubaram não... não...", enquanto pensava.

Então surgiu a gata. A rainha do Quintão, 34 anos, divorciada, deusa branca dentro de um biquini roxo de duas peças, idolatrada à distância pelos boêmios do Bar dos Amigos, do Bar do Piroca e do Yes, e de toda a praia, se aproximou e sentou na areia, ao lado do Contra: 

- Desculpe, foi tu que perdeu um gatinho?

- Perdi. Puta que pariu, branca, não sei o que aconteceu, a gente entrou no mar, furamos ondas..., depois voltei pro bar, lá adiante ó, está vendo, e foi cerveja, churrasco e papo, e não vi mais ele... Não posso ter perdido no mar. 

O Contralouco respondeu com o olhar distante.

- Tu é o Bruno, né, Bruno Contralouco, o cara que bateu de porta em porta pedindo tabuleiros de xadrez emprestados...? Por que Contralouco?

- Ah, apelido de infância, nem sei a razão. Sim, fui eu, mas os tabuleiros eram para os amigos, eu não jogo muito bem, é pá e teve, e no teve normalmente eu mifu.

- Não se lembra de mim?

- Bem, não sei, desculpe... a correria.

- Tu bateu lá em casa, quase derrubou a porta, eu estava sozinha, no banho, depois me disse que uma menina bonita como eu não te deixaria na mão, emprestei um pequeno tabuleiro magnético... Foi quando desandou uma chuvarada.

- Bah, na hora do toró? Peguei água do céu, moça, água da chuva limpa a alma da gente. Então era tu a bonitona?

- Você parecia criança tomando banho de chuva, rolando na grama com o cachorro da vizinha, um milagre, pois aquele bicho é uma fera de brabo. Tá famoso na cidade, o cara que anda em via-sacra pelos bares, com um gato no ombro. Leite pro gato e cerveja pro dono...

- Cachorro basta ir pegando de amor, guria, normal. O Gatolino é muito novo pra tomar cerveja. Tou ensinando a falar, mas por enquanto só sai miau. Putz, onde será que se meteu o Gatolino? Não pode ter morrido afogado, tem sete vidas, hoje recém tá gastando a segunda, a primeira queimou ainda nenê, quando impedi que afundasse no bueiro, num dia em que Porto Alegre quase submergiu de tanta chuva.

Nessas alturas os boêmios estavam concentrados na frente do Bar dos Amigos, vendo ao longe a rainha de papo com o Contra. 

Clóvis Baixo abriu o buquimequi a 20 pilas: casa na festa ou não casa na festa. Deu maioria pelo casa na festa, 18 a 11.

- Teu gatinho é amarelinho com branco?

- É!

- Moço, desculpe, eu fui malvada em demorar a contar. Perdoe-me, é que eu queria ter certeza, tu não é o primeiro que perde algo aqui. O teu gatinho está ali adiante, a uns 300 metros, com a minha mãe. Meu nome é Ingrid. Vamos lá buscá-lo?

- Oba! - exclamou o Contralouco -, e deu-lhe um beijo no rosto.

- Qual é a raça dele? -, ela perguntou.

- Sei lá, a Jêze diz que é marca diabo.

Levantaram-se, e aos primeiros passos ouviram o coro de incentivos, em altos brados, vindos lá da frente do Bar dos Amigos: "Pega na mão, gelado!", dos que apostaram na opção casa na festa.

Mr. Hyde, a fim de dividir os R$ 580,00 por 11, trovejou com seu vozeirão: "Cuidado, rainha, ele é procurado pela polícia!".

O Contra enrubesceu, mas não se deu por achado. 

- Moça, me dá um abraço, para calar aqueles palhaços?

Ganhou o abraço colado. Em seguida, por razões que desconhecemos, porém suspeitamos, se beijaram. Dizem os antigos moradores que a brisa marítima do Quintão favorece encantamentos amorosos.

Seguiram buscar o Gatolino, de mãos dadas.

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