"Hoje eu pobre profano
me lembro de ti e dos meus desenganos
Oh! meu Alto da Bronze dos meus oito anos"
me lembro de ti e dos meus desenganos
Oh! meu Alto da Bronze dos meus oito anos"
A relíquia de Plauto de Azambuja Soares, o Foquinha, e de Paulo Coelho - este é
outro cara, pelo amor de Deus, não aquele múmia, este
Paulo Coelho era um querido e decente pianista e compositor, tinha orquestra.
"Alto da
Bronze", composta em 1938. O ano da minha primeira morte, morri com cinco tiros pelas costas num amanhecer na Alfândega, mas que ninguém se preocupe, foi nada, estou aqui. O título referindo, como bem sabem os moradores deste alegre porto, ao logradouro (só os Correios usam esta palavra, sempre faz-me rir) e a bela e teimosa negra de ébano que morava num matinho lá em cima, nos altos do Centro, de onde se via o maravilhoso rio Guaíba passando, sem prédios para cortar a visão, com seus pescadores e crianças brincando à beira, pequeninos vistos lá de cima.
Em 1916 foi que soube da negra Bronze, de muitas décadas antes. Uns negros velhos me contaram no Mercado Público, com os olhos brilhantes de cachaça descreveram a negra que ouviram dos seus pais escravos: alta, esguia, carnuda, falsa magra, brava, olhos com fogo se eles se aproximassem, vista assim de cinquenta metros parecia um estátua de bronze, parada em frente ao casebre com ar de desafio. Isso os pais que contavam ouviram dos pais deles. Morava sozinha lá em cima, no mato. Tempo esse, em 1916, quando me contaram e fiquei com vontade de conhecê-la embora soubesse que voltar no tempo não podia, tempo em que eu morava numa pensão mucufa na Rua da Praia com cinco mulheres alegres, no
segundo e último andar, todinho nosso.
Foi nessa época que conheci Pixinguinha, um neguinho de 18 anos que chamavam de Chico Dunga, ficou meu amigo e ali embaixo no Centro, num boteco da Rua Clara, nós todos bêbedos em madrugada alta, compôs um choro-polca a que denominou Carinhoso. A modéstia me impede de dizer em quem se inspirou e dedicou em homenagem.
Foi nessa época que conheci Pixinguinha, um neguinho de 18 anos que chamavam de Chico Dunga, ficou meu amigo e ali embaixo no Centro, num boteco da Rua Clara, nós todos bêbedos em madrugada alta, compôs um choro-polca a que denominou Carinhoso. A modéstia me impede de dizer em quem se inspirou e dedicou em homenagem.
À frente da pensão começava a se erguer um prédio fino, com projetista
alemão, que viria a ser o Hotel Majestic (hoje Casa de Cultura Mário
Quintana), unindo os dois lados da Travessa Araújo Ribeiro. Uma barulheira
danada a construção, todo santo dia, tanto que mudamos para o Alto da Negra
Bronze, uma beleza aquela casa antiga, com abacateiro nos fundos, e flores, e ainda tinha um resto de matinho por lá. Apaixonei-me pela neta da
negra Bronze, uma escultura de ébano também, saiu à avó, mas esta é outra história.
Lá em cima onde passa a Rua Formosa, que os malditos políticos para agradar aos milicos mudaram o nome para Rua Duque de Caxias, vontade de dizer umas besteiras, deixo assim, lá é o Alto dela, só dela, eterna Bronze. A historiagrafia semi-oficial insiste em dizer que ela era prostituta, porque o assédio era grande por parte dos magnatas, e não levavam. Deixem que digam, a difamação foi o que restou aos indignos repelidos e poderosos, não sabem o que é passar fome e suportar com bravura. Eu vi, minh'alma estava lá.
A canção diz um pouco do meu grande amor por Porto Alegre, eu que cheguei
de passagem e fui ficando, por horrores, amores, desenganos e mortes, pela
ordem mas em certo momento em completa desordem, e ainda me sinto em trânsito, um menino que não sabe para onde ir.
Quando morava no Alto da negra Bronze - muitos anos fiquei lá - me sentia menos
intruso. E agora meu rosto se encharca, mal vejo as teclas pelas lágrimas, preciso voltar lá, plantar um matinho, ainda que seja nos fundos de alguma casinha que restou.
Em voz de homem soa melhor, foi feita para homem, mas não
encontrei.
A Elis não se aguentou e disse, pouco se importando com o
gênero, sem alterar a letra, nada de profana, que como todo artista que se preza ela era: disse profano. A
Pimentinha era fogo, deveria ter casado comigo, a boba, bastaria comparecer a botecos de pobre perto do rio, em torno de meia-noite ou mais, que me encontraria, os anos de vida que nos separavam não eram tantos assim. Dia destes volto ao limbo e a encontro.
Salve Foquinha, Paulo e Elis, que exaltaram o Alto da Bronze que tanto amo.
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