domingo, 5 de septiembre de 2010

Fausto Wolff

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Querido Fausto

Achou que eu ia esquecer, hein, que hoje fecha dois anos que você se mandou? Nem em sonhos, paisano. Em 1º de agosto adiantei algumas linhas, pelos dois anos, motivos lá expostos. Naquele dia chorei mais um pouco. Droga de coração mole. Enfim, por esta mando notícias.


Acabo de ouvir Tarde Fria, esta música anda me perseguindo. Do Poly e do Henrique Lobo (é hoje!). No Brasil nunca toca, e ouvi esta maravilha em rádio interiorana do Uruguay. Sei que conheces, Cauby, Almir, muitos gravaram, aqui deu com a Ângela Maria. Viajei no tempo, melancolia. Ando nervoso, quase desmoronei. Mas prometi não desabar ao escrever mais algumas linhas para ti, mesmo não estando certo de que vás receber. Também não estou certo de que tenhas perdido alguma coisa indo embora daqui. Certeza somente tenho de que nós perdemos muito com a tua saída.

Gostaria de estar no meu covil de Porto Alegre, de lá conseguiria me expressar melhor, sabe como é, o costume, na Olivetti da gente é melhor. Nesta aqui ainda não sei onde é a descarga. Estou voltando, ver uns baratos por lá, mas naquele covil não vou mais, não se vê viv'alma além das almas do cemitério em frente, mas é só aparência, está cercado. Quanto mais me aproximo do Brasil, mais recebo notícias de Mr. F. Febraban e do banqueiro Daniel, sequiosos de sangue, pretendem me acuar logo ao cruzar a avenida..., a fronteira, mesma coisa. Eles não perdem por esperar.

Porto alegre e seguro agora é o Burundi, tenho um covil instalado em um local estratégico daquele país.

Lá onde estou é outra coisa, Lobo, irias adorar, é o lugar mais tramposo do planeta, mas não tem hipocrisia, a mentira é punida severamente.

No Brasil sabes bem: o cara é o maior gatuno, mas com pinta de honrado, faz pilantropia com grande publicidade (perdão), sempre deduzindo do imposto de renda, claro, os seus iguais o premiam, recebem comendas, Grã-Cruz, Colar, sei lá, do Cruzeiro do Céu. Falei de outra vez, me dá azia ver todo ano o ganhador do troféu Guampa de Aço, entre outros, eu sei como construiram as fortunas.
Aí aparece aquele gato bem gordo na tevê, cara de santo, sorrisinho de não mereço tanto, a imundície que tu sabe. Lá não.

Lá o quem é quem aparece nos nomes, na profissão, tudo registradinho nos documentos do malandro, número de série e tal. Vai comprar uma mansão, o corretor ladrão pergunta: nome? Daniel D. Ladrão. Profissão? Banqueiro Ladrão. Ótimo, senhor, idade? E segue. No caso específico, declarar-se apenas Agiota é o suficiente, substitui o Banqueiro Ladrão a contento. Quer abrir uma conta bancária, o escravo ladrão pergunta: nome? Paulo Malufão Ladrão. Profissão? Político Ladraozão. Pois não, um instantinho. E vai ligar para o sindicato para confirmar.

Outro, nome: Renan Estéril Ladrão. Profissão: Político Contrafação. O outro vai comprar uma partida de diamantes: nome? Gilmar Dantas. Profissão? Juiz Corrupção. Pois não, doutor, é pra já, e liga para o tribunal.

Vai uma fazer uma comprinha menor: Nome: Jader Barbicha Ladrão. Profissão? Ladrão e Assassino Profissional, pago à vista. Pois não, senhor, o que vai querer? O diretor do BB - Banco do Burundi adquire um avião: nome? João Cabo Eleitoral Ladrão. Profissão? Diretor Improbidão. O funcionário público: nome? Otacílio Borraxo Ladrão. Profissão: Secretário da Fiscalização da Prevaricação. O chefe do banco centralizado oficial, nome? Henrique Washingtão Ladrão. Profissão? Mandalete Externo Ladrão.
Uma beleza, Lobo.

O empresário: Nome? Gerd J. Negociatão. Profissão: Exportação Superfaturamentão. Esse cara é grandão.

Estão propondo alterar o sistema, subtraindo o "ladrão", é demais, os arquivos se misturam, é equivalente ao nosso silva, mas também relacionado à profissão, quase todo mundo é.

Agora, não pode é mentir, ah, não pode, pega uma cana federal. Por exemplo; Profissão? Ministro das Contas, aí vai para a cadeia, faltou o ladrão no final.

Se alterarem a legislação, subtraindo o Ladrão no nome, este ficará legalmente implícito. Restarão os outros, como o assassino profissional, sonegador, prevaricador, esteliô e por aí vai, uma infinidade.

A palavra "subtraindo" me fez lembrar que uma profissão muito respeitada lá é Subtrator, uns caras que mexem com o orçamento nacional.

Apareceu-me um conterrâneo querendo fazer negócios, o Carlos Honesto, olha o nome que o sujeito foi arrumar. Não imagina o trabalhão que me deu para tirá-lo do xadrez, explicar pros caras que no país de origem a mentira é que tem valor.

Logo ao chegar, uma das minhas negras me alertou e imediatamente me transformei em Salito Ladrão, profissão Rufião. Depois, para amenizar, alterei para Cáften. Ah, tem disso: lá pode alterar quantas vezes quiser, num dia o cara é Empresário Ladrão, no outro já pode ser Político Ladrão.

Outro dia explico melhor isto, não quero te aborrecer, vai longe, é complexo. Depois te conto o que estou bebendo, vá ficando com água na boca.

Tente aí adivinhar de quem é o carão que o JB de hoje, que agora é digital, traz todo colorido na capa, quem, quem, quem?

Se respondeu, Eu, o Fausto Wolff, o amado Lobão, o melhor escritor da Terra, o mais bonito, o mais valente, o mais doido, o mais empinante, o mais mulherengo e o melhor amigo de todos os que não são inimigos, acertou na pinha.

O mais bonito vai por conta do Ziraldo, que deve estar com a consciência pesada. A cara-de-pau do menino maluquinho continua a mesma, como vês, cada dia mais sólida. Na matéria lá dentro do JB alguns dos teus amigos, todos caras famosos, dizem algo a teu respeito.

Claro que sei que misturo tu com você, olha quem falando, o mister Sei do cacófato. Sei que tava brincando. Eu também.

Ã..., bem, dizia que lá estão, dos teus muitos, uns poucos amigos famosos, creio problema de espaço, o jornal digital começou recentemente. Não entendi porque não me convidaram, sei que meu cachê é alto, mas isto eles sabem que eu faria de graça. Deixa pra lá.

Lembra quando te convidei para fazer a pele de um buteco em Brasília? Não pôde ir, né. Medrar sei que não medrou, das muitas pestes que há por lá, não pega em quem é do bem e bem bebe, mas eu fui. Derrubei o Carpe Diem inteirinho, num sábado do meio-dia à meia-noite. Ontem comentei de passagem no bloguinho.

Eu, a Dorucha, a Carmen Kozak e mais umas vinte jornalecas do mesmo e de outros periódicos, juntamos as mesas e azar. Os machos eu mandava sentar em outra mesa lá longe, sem abrir o bico, naquele dia eu estava com a macaca. Um espertinho da Globo News achou que era brincadeira e a Dora teve um chilique ao me ver levantando devagar enquanto empurrava o chapéu para trás. Bobagem da Dora, se preocupar com pouco, eu tinha uma adaguinha de nada, brinquei que ia apenas estripar o sujeito.

Acabou tudo bem, obviamente: eles ficaram lá na mesinha que indiquei. De costas. A Carmen, linda e amada, já deves ter encontrado por aí, como sabes partiu cedo demais, diz a ela que mando um beijo.

Pelas nove da noite o estoque já pedia socorro, superlotou o bar, certamente a cidade queria ver o estrangeiro que não tirava um chapéu do Bogart que lhe descia aos olhos. Eu ria muito com o gataréu, afirmando que o Nei Lisboa dava de dez no Caetano Veloso, as moças achavam muita graça, do Sul só tinham ouvido falar do seu Mário Quintana, algumas recitavam fragmentos de suas poesias. Fiquei de voltar lá, dar uma geral em todinhas as jornalecas da cidade, uma por uma, mas femininos compromissos me retiveram na Portinho.

Em resumo, isto quis dizer que eu o ajudei a derrubar o Luna Bar, e o senhor não me ajudou a derrubar o Carpe Diem, capiti? Achou que tinha esquecido? Numinha posso.

Estou aqui enchendo linguiça, sem saber direito o que dizer, não queria ficar triste, pieguice de merengueado é dose. Dizer que sem ti o Brasil perdeu muito de sua graça? Todo mundo já sabe.

Falar em dose e em merengueado, Faustin, cometi uma besteira legal ontem: pela manhã fui ao mercado atrás de carne e num corredor vi uma garrafa de absinto na prateleira, linda, doble verdinha, verde do líquido e rótulo verde de tonalidade mais forte, cheia de frescurinhas. (Não posso descrever o mercado, você sabe, o Febraban, mas a bebida sim). Passei, comprei costelas e matambre, voltei, olhei outras mercadorias e saí. Subindo a rua, no meio da quadra ouço a voz de mulher, fininha, toda frufru sussurrando nos meus ouvidos: "Salito, amado, volta, vem...". Olhei para trás, para os lados, ninguém.

Lá adiante entrei numa loja e comprei um xale para a Dolores. E a vozinha insistindo: "Salito, amado, volta, vem...". Você já sacou, mas o otário aqui demorou dando voltas e voltas e nada de entender de onde vinha, se de dentro da cabeça, sei lá. Descendo a rua, estava passando na frente do complexo onde comprei a carne e... "Salito, isso, gostoso, entra, vem, vem...". Era demais, não tive dúvida, entrei e parei sorrindo na frente dela. Ela enverdeceu mais ainda, de alegria.

Hoje, velho Lobo, pensando em ti, abri dizendo: vou bebê-la todinha, gostosa. Meu, estou na metade, mas não vai mais, a mocinha continua forte pra caralho, 70 grados, com aquela vozinha tentadora quase me mata. O que me salva o estômago son unas patricitas, livianas e suaves, que entorno junto.

Voltando ao JB. Além do Ziraldo, que diz "Quando jovem, era deslumbrante de tão bonito", gostei do que outros caras escreveram a teu respeito:

Jaguar; "Wolff escrevia melhor que Bukowski e bebia mais também".
Millôr: "É o único de quem eu posso dizer: Não morreu. Gastou sua vida".
Sérgio Augusto: "Um ser humano que não abriu mão de suas idéias".

Tem outros ainda, olhe tu mesmo. Dos transcritos, tirando o Ziraldo (não sei de nada, eu, hein), assino embaixo do pouco (o espaço...) que disseram.

O que faz a bebida, espichei a cartinha. Ah, antes que me esqueça, assunto recorrente são as eleições ali no Brasil. Olha, meu, aposto qualquer coisa, até o martírio mais horrível, como, ã..., como namorar aquela social democrata que veio ao mundo desprovida de senso de humor, a Ieda, em pleno brique da Redenção lotado domingo de manhã, caso você, se ainda encarnado, não estivesse apoiando o Plinião. Social Democracia coisa nenhuma, lá estão aninhados o pessoal da ditadura, civis e militares, do assalto ao trem pagador, o escambau. O resto, tirando alguns nanicos, é tudo gosma da mesma latrina. Puxa, eu falando esse tipo de coisa num dia em que pretendia exaltar a tua figura, desculpe.

Outro dia a Clarice Wolff, uma loba das tuas, me deixou um recadinho. Aquela sim é maluca de atar, mal de família. Ainda me chama de Salgadinho! Adorada.

Estou fazendo uma seleçãozinha dos teus escritos, tudo não cabe, hora destas bate lá no bloguinho.

Era isso, meu velho. Amigos, escribas e parceiros de bar sei que não te faltam por aí, os melhores já debandaram. Qualquer dia destes apareço, para apreciá-los de uma mesa próxima, ao menos.
Saudades.
Sempre teu
Salito

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