.
Há quem diga, com propriedade, que cada um escreve sobre o que conhece, isto é, sobre o que já viveu. É verdade. Impossível alguém escrever sobre o que nunca viu. Daí este esclarecimento: o "já viveu" significa, no contexto da assertiva, ter vivido ou testemunhado, ou simplesmente ter ouvido falar. No limite, um déjà-vu. Com esta, notem os amigos que saltamos fora rapidinho, antes que os trilhões de leitores comecem a imaginar coisas. Já vimos a estória que segue ser contada de muitas maneiras. A que vai diz respeito a um querido boêmio, habitué do Botequim do Terguino, ali do Beco do Oitavo, que por razões óbvias não declinamos o nome. Autoria, de papo de botequim, no botequim fica.
DESMANCHE
Sinceridade: não sou
do tipo que chama a atenção pelo porte físico ou coisa parecida, franzino
e narigudo. Já passei dos quarenta, meus
cabelos me abandonaram há uns sete ou oito verões e minha
protuberante barriga denota o grande sucesso que tive na arte de comer e beber.
Minhas rugas procedem da total falta de credibilidade em protetor solar (esse troço não é coisa de homem
sério), aliada a centenas de noites que fiquei sem dormir na expectativa de não
ir para casa sozinho. Bom, esse sou eu, mas em má-fase, já tive melhores.
Ainda bem que para
caras como eu (tem um monte igual por ai) existem os desmanches.
O que é um desmanche? Sinceridade: na mesma proporção
de caras como eu, existem mulheres com características semelhantes. Se
não são carecas, têm cabelos mal cuidados; se a barriga não é tão grande quanto
a minha, tem lá aquela coisa instalada ali na frente. Ruga então... Puta
que pariu, não quero falar disso.
Voltando ao assunto,
um desmanche é um local onde tem porteiro-gorila vestido de pastor da universal, música de quinta, bebida falsificada, um globo vagabundo rodando no
teto, banheiro mal-cuidado (bah, mal-cuidado é elogio), etc. O local tem que ser escuro porque, sinceridade: com
muita luz acho que ninguém pegaria ninguém, mesmo enchendo a cara
antes.
A balada onde sempre
vou (não vou chamar de desmanche, as mulheres se ofendem, pois há quem diga que
estes locais tem este nome porque as princesas que os frequentam desmancham em um
toque) fica perto de onde moro, pois não tenho carro e, se arrumo alguma coisa,
dá para ir a pé até o apartamento.
Coloquei minha roupa
de passeio e fui para a caçada, com vintão no bolso: cinco para entrar e o resto para beber e
comer um cachorro-quente na hora de ir embora.
Dancei forró, pagode,
rancheira, lenta (não sei nem como se chama hoje em dia estas músicas de se dançar apaixonado,
eu falo lenta) com umas dez mulheres diferentes. Passava das três da
madruga, eu já num prego do cacete, achando que ia acabar mais uma noite
sozinho, só de pensar, putz..., quando saquei uma gata me olhando. Bom, era eu ou uma meninada bêbeda, o desmanche tava estourando. Não fui agraciado com
beleza, mas... Papo... Bom, sai da frente, papo eu tenho. Minto bem,
com ares de cara sincero. Paciência para ouvir a hipocrisia da infeliz
também tenho, a história com seu ex, vocês sabem, o quanto o amava, aquela vez na praia e tal. Aproximei-me.
Era um loira com uma
calça preta com listras amarelas (estas calças de ir em academia), uma bota que
imitava couro de cobra, com um salto bem alto. O cano da bota ia até os joelhos,
o que dificultava um pouco os movimentos da "mocinha". Sua blusa
era vermelha, toda cheia de umas coisas brilhantes (não sei o nome desses troços). Não sei se é moda, mas, tudo bem, eu não tava procurando ninguém para
ser modelo e sim apenas pra tirar o meu atraso. Encostei do lado e comecei a
jogar meu charme.
Sinceridade: não
precisei conversar muito. Cinco minutos de conversa e ela topou ir até o morredor. Eu também
aceitaria, no lugar dela, pois o primeiro ônibus que iria em direção da
sua casa só passaria a partir das sete horas. Fomos caminhando até o
meu apartamento. Quando passávamos por luzes fortes eu podia ver com mais clareza o
seu rosto.
Amigos:
se alguém aí tem menos de dezesseis anos e/ou estômago fraco,
aconselho interromper a leitura agora, pois daqui pra frente a coisa
começa a esquentar. Tinha mais rugas que meu saco, já
não sabia se era loira ou morena. Quero dizer, era morena, pois o cabelo
estava do ombro para baixo loiro e para cima moreno. Segundo ela, com a próxima
grana que ganhar de diarista vai dar um jeito no cabelo.
Sinceridade: A dona
era até gostosa, para a minha bola, mas feia pra caralho. Mas, pombas, eu
não queria para bater foto, só não aguentava mais, precisava comer uma mulher,
nem que fosse ela.
Abri a porta do apê e
já fui beijando e socando a mão em tudo quanto é lugar. Aí, como toda mulher, começou:
"Pára com isso! O que é que você tá pensando que eu sou?"
Suportei a vontade de mandá-la tomar naquele lugar. Tudo bem. Todos nós passamos por isso, até as feias tem direito àquelas frescuras
do início. Veio com a história do ex.
Dei mais um beijão e já coloquei a mão no bolso e peguei umas balas.
Compreensível: Quatro horas da manhã, fumando, bebendo, qualquer um fica com
bafo de onça. Como toda mulher que você põe no carro ou leva para seu
apartamento (até as feias são assim), então ela veio com aquele papinho: "Acho
que está na hora de ir embora". Puta que pariu, a gente tem que passar por
isso. Veio com a despedida do ex. Este arrumou um empregaço em Manaus e a deixou morando por uns dias no apartamento de uns amigos, espere que eu volto te buscar no mês que vem.
Tudo bem, eu ali de
barraca armada e ainda tinha que vencer esta fase. Bom, fiz minha parte no teatro de
sempre. Paciência, sorri e fiquei ouvindo simulando interesse. Conversava um pouco, beijava um pouco, passava a mão, pegava a mão dela e colocava em cima da
minha calça, sabe como é, todo aquele ritual básico. Passados longos vinte minutos desta interminável lenga-lenga, a Marta (este não é o nome verdadeiro, mas vamos
deixar como se fosse), deixou que eu tirasse a sua blusa. Quando tirei a blusa encontrei um
enorme obstáculo: estas cintas que apertam o corpo para tampar um pouco a
gordura. Tirei aquele troço. Meu Deus! Desandou o mundo.
Sinceridade: O cheiro
que saiu dali de baixo, se minha tara não fosse do tamanho do Pão de Açúcar, eu
teria brochado, mas achei até compreensível; afinal, ficar a noite toda
dançando com aquele negócio quente enrolado no corpo, não podia dar em outra
coisa. Passados
alguns minutos meu nariz já havia se acostumado com o cheiro. Pra quem já tinha
beijado a boca fedendo a cigarro, um WC não ia matar.
Tirei o corpete (foi
assim que ela chamou o negócio) e comecei a chupar os peitos. Tava meio salgado, quero
dizer, tava bem salgado, mas, vamos lá, era para comer mesmo, que mal tinha
estar temperado? Fiquei ali chupando aquela coisa flácida por uns cinco minutos,
até que finalmente a Marta pegou no meu. Tinha, finalmente, quebrado
a barreira entre o acho que vou embora e o acho que
vou te dar. Começamos
então a fase final. Ela com a mão no meu e eu com a mão na dela.
Não deu dois minutos
de dedinho e já veio com aquela outra famosa "Eu quero! Eu quero!" como se não
quisesse desde o começo, mas, tudo bem, respeito. Se não respeita, fica com
fama de insensível e... bom, deixa pra lá, vamos ao que interessa. Como todo
bom cavalheiro, tirei a mão de lá e coloquei no nariz para "reconhecer o
gramado". Sinceridade: Minha sorte que meu pinto não tem nariz, se tivesse
acho que não encararia a parada.
Começamos a nos
despir. Fui abaixar a sua calça e me deparei com as botas. Preciso comentar o cheiro que
saiu de dentro das botas? Se tivesse lugar, poderia jurar que ela escondeu um
gato morto em cada pé. Pensei em dar a primeira depois de um banho, talvez
melhorasse um pouco as condições.
Fomos até o banheiro e, para variar,
estava sem água. Sinceridade: Tava louco pra dar uma trepada, os testículos
tavam doendo. Comi ali mesmo dentro do banheiro (sim, usei camisinha!). Comecei
sentado na privada, depois encostei a
Marta na parede do banheiro e peguei ela por trás. Pra não ir muito rápido,
fiquei contando quantas bolas de celulite ela tinha na bunda. Quando chegou na
vinte e cinco, ela pediu para mudar de posição, eu estava
tão empolgado com a minha estatística que nem percebi que ela batia a cabeça na
parede com força e acho que já tava machucando.
Fomos para o corredor
do apartamento (no banheiro não tem espaço para ficar deitado). Dei umas
bombadas ali e fomos terminar na cama. Quando consegui ardeu o canal. Ela disse
que gozou três vezes (quem será que está mentindo, eu ou a Marta?).
Entrei então naquela
parte conhecida pelos homens como o cúmulo da eternidade (Cúmulo da Eternidade:
Os minutos entre depois que goza e a hora em que leva a mulher embora).
Sinceridade: com pinto mole não há a menor possibilidade de encarar a
Marta. Já nos preparativos finais para ir embora ela disse que estava com fome.
Meus vintão já tinham ido para o espaço (as balas não foram de graça).
Perguntou se não podia pedir uma pizza ou comer um cachorro-quente. Para não
ficar feio pra minha cara, ofereci-me para fazer algo para comermos, muito melhor.
"Nossa, que romântico!" Pronto! Só faltava a baranga
achar que gostei dela.
Fucei os armários e achei
dois miojos. Na geladeira tinha uma dessas latas de molho de tomate, grandona, pela metade, que
fazia um ano que estava lá. Fiz a gororoba. Tinha dois tomates de verdade
que só parti em quatro e coloquei junto para tirar aquele ar de anemia do prato.
Tapei a mesa com um pano de prato e sentamos. Comi pouco, quase nada, mas a Marta acho que fazia uma semana que não
comia, se atracou. Não devia ter colocado aquele molho. A Marta comeu tudo e começou
a passar mal. Ficou com dor de barriga. Até me deu dó dela. Dar
um cagão na casa de alguém que você acaba de conhecer, não é o
"sonho" de nenhuma mulher.
Correu para o banheiro. Cinco e dez da
manhã, nenhum barulho na rua, a porta do banheiro não fecha direito.
Sinceridade: nunca uma mulher tinha ido ao banheiro perto de mim, e logo na
estreia tive direito a show de efeitos sonoros. Aquele barulhão de quando você
acelera uma motoca velha denunciava a forma "líquida" em que a
coisa tava vindo. Minha TV queimada, o radinho meu irmão havia pego emprestado
para ir ao jogo. Tive que ouvir a sinfonia do começo ao fim. Ouvi quando ela
tentou puxar a descarga (estava sem água, lembram?), depois quando tentou abrir
a torneira para lavar as mãos, idem.
Veio então nossa
heroína daquela batalha que achei não ter mais fim. Foi quase meia-hora de gemidos e
barulhos de motoca e de água caindo no vaso. Ela saiu pálida do banheiro, deixando lá toda
a sua obra, deu uma cheirada na mão, esfregou-as e me abraçou. Aquelas
mãos passando em meu rosto como quem quer fazer um carinho, não sei quanto
tempo poderia aguentar.
Pegou no bobo, viu que
estava mole e disse: "Vou levantar o bebê de novo" (bebê?). O danado
mesmo com todo aquele cheiro de enxofre no ar (ele não tem nariz, lembram?)
ficou em pé de novo. A dona então resolveu escancarar: começou a fazer um
streap (nem sei escrever isso). Tudo bem, vamos respeitar o ritual, pra não parecer insensível. A sala
estava meio escura e ela, achando que estava realmente agradando com aquelas
incontáveis bolas de celulite (tinha parado a contagem na 25, lembram?), acendeu a luz.
Quando tudo ficou mais claro olhei para aquela bunda e pensei: puta que pariu,
a gorda tem um monte de espinha na bunda para ajudar.
Na verdade, para meu
espanto ou alívio (já não sabia mais o que pensar) não eram espinhas. Eram
algumas sementes do tomate que coloquei na macarronada. A
desinteria deve ter escorrido pela sua bunda e o papel higiênico
não limpou tudo, elas ficaram por ali grudadinhas. Peguei minha
cueca, dei uma cuspida, limpei em volta e comi a Marta de novo.
Sete horas da manhã ela pegou o ônibus.
A água voltou às dez.
Sinceridade: não quero nunca mais tocar neste assunto.
A água voltou às dez.
Sinceridade: não quero nunca mais tocar neste assunto.
No hay comentarios.:
Publicar un comentario