sábado, 23 de febrero de 2013

Me dá a penúltima

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Vai para a meninada boêmia do Beco do Oitavo. Não sei se os mais "passadinhos" de idade, como Lúcio Peregrino nos seus 39 e Wilson Schu nos seus 52, belíssimas vozes, já  cantaram o samba-canção para a cambada de "antes dos 30", que lá comparece de 6 a 29, em alguma madrugada festiva, aposto que sim. 

Alô, bundão broxura que lucra com o bafômetro, ei, governador, prefeito, congresso, conjunção anal, de merda do Rio, e SP, e RS? Seu "bobo", se faz, a droga é o problema que vocês criaram, aqui os de 8 ou 14 só olham, bebem suco, papai e mamãe ao lado, amam música boa, e pensam lá consigo um dia eu chego lá: serei boêmio, vou trabalhar também, e muito, vou salvar o Brasil, as crianças do Brasil. Enquanto não vem os 18, depois 21, o neguinho trabalha e estuda, lê os clássicos e tudo; aqui na palafita, com 34 crianças, a última sessão musical no pátio foi com Mahler. A leitura foi um diálogo de Sócrates, pela alma de Platão. E é pouco, o ideal é todos os dias. Mania de mudar de assunto.

O moleque será fogo, será foda, ai aquele chapéu na cabeça do moço sério ao passar de madrugada, quieto, com pudor e respeito, modéstia sincera, mas que pelo andar está escrito "aqui, não"... derruba os corações das moças do Beco da Fonte. Das semelhantes. Nas marias-chuteiras, marias-boates, maria-carro, etc, haja maria para tudo o que não presta, pobres meninas despreparadas, ele não gasta o leite, que se fodam, que vão fazer filhos com burros jogadores de futebol ou lutadores de luta-livre, nem todos, nada de generalizar, ou pior, com os Eikes vômitos de ruins, o lindo do carrão do papi, aqui sim é geral, nessas é preferível uma punheta bem batida, pensamento lá naquela falsa magra de óculos... 

Embora, ao descer as escadarias do Beco da Fonte, o menino se comova com o peso por dentro do paletó, em cima do coração. 

No lado do coração, em cima, mas só para se defender, seu moço, a gente ensina, jamais dar um tiro no presidente do Senado - merece doze -, ou cobra equivalente, nada de "ministros", aqueles cacacas asquerosos e covardes, nem em ninguém. 

Defendam, se preciso, guris, os que não podem se defender. Tenham, é só o que queremos, a síndrome de Jesus Cristo que todos os boêmios têm, e nada mais.

É do poeta maior Aldir Blanc (letra), a voz e aparição principal no vídeo, em parceria com João Bosco (música). Temos na discoteca da palafita na voz grave da lendária cantante Nora Ney, pero infelizmente não a encontrei cantando essa jóia no youtube. 

Olhem a turminha de irmãos paus d'água que os cercam, ao Aldir e ao João: Moacir Luz e até alguns que não conheço (sou muito novinho), mas que não será difícil descobrir, pois a gente, meus companheiros e eu, em férias, aqui pendurados no Sul do mundo nos segurando para não cair sem pára-quedas no Burundi, sabemos os nomes dos bambas, vida e obra, mas alguns nunca vimos, o Brazil colônia mostra outros talentos, vocês sabem, como diz o Ancelmo Góis.

Peguem aí, ó notívagos, a quem tanto faz se é noite ou se é dia. 

Chorem, lembrem-se daquele amor que perderam, quando ela subiu nos tamancos e pela janela jogou as roupas na rua. Tadinha, depois entrou numa fria que parecia quente e hoje, reclamando ao pinguim da geladeira, morre de arrependimento. 

Essa do pinguim lembro quando casei com uma onça italiana da serra gaúcha, casei por uns tempos, tempos indefinidos, claro, como ela também fez, e um belo dia ela me aparece com um enorme pinguim para a geladeira, num cubículo que havíamos alugado para sermos felizes. Ficou lindão, o pinguim instalado na branca. 

Não hesitei, com um bolero do Aldir Blanc rodando no teto: na hora botei nome no bicho: Aldir Blanc. Todo dia eu acordava, entrava na cozinha e saudava: E aí, Aldir, paradão assim acho que não comeu ninguém, meu chapa. Eu e a tua dona cometemos horrores nesta madrugada, tou até com vergonha, cada absurdo... 

Se tinha que sair para trabalhar, eu passava café; se não, verificava se havia limões, uma caipa cairia bem com chimarrão.

Ela ria, ria, de felicidade ao acordar, nesses dias em que eu não saía para trabalhar. O Aldir, obviamente, ficava calado. Ciumento como só, ainda não me conhecia, normal. Depois se tornou meu amigaço, e eu dele, dividi mulher, grana não, pois ele preferia não sair para gastar.

Depois o negócio de sou só tua (traduzindo: tu é meu e já ficar em casa) começou a me dar nos nervos. Prisão não era comigo, e ela não queria sair junto para ouvir flautas e cavaquinhos, bandoneóns, saxofones, trombones, violões, na noite, blocos de sujos, ela com minha roupa, paletó à Ébrio do Celestino e chapéu Bogart, eu de odalisca com os sapatos dela. Queria me aprisionar, ao tempo em que me gastava na cama, meu Deus, haja fogaréu naquela cidadã, e brincar de casinha, não sai daqui. A primeira era comigo mesmo, mas a segunda, muito novo, despreparado... Burro, ou não, não queria brincar de casinha, precisava ver o mundo. 

Daí que eu chegava de madrugada, ela pelada na cama se fingindo de dormindo. Eu tirava a roupa, sapatos, na saletinha, sem ruído, entrava na cozinha pisando em ovos e via o Blanc na hora de pegar a penúltima, esquecia de andar em ovos, o silêncio para "não acordar" e saudava, alto e bom som: - E aí, Aldir, como foi a noite?, tu tá muito quieto, meu caro! O que te falta é uma pinguina!

Eu mudava a voz, falsete, fininha, e respondia por ele: - Uma droga, meu camarada, só eu e essa gringa pelada, nervosa, morta de tesão, puta que pariu, não há o que chegue, se ao menos me despregassem daqui... eu encestava de tudo o que é jeito. 

Então eu ficava de papo com meu amigo querido, o Aldir Blanc, sentado num banquinho da diminuta cozinha, ìamos longe. - O que tu acha daquela vizinha da mercearia, Aldir? "Ele" respondia: - Parece tarada, mas muito ruim de cabeça, um perigo, sai fora, tu é casado e ama a Gringa, é um moço honesto, sincero, sofrido, não vale a pena, nem pensar. - Quantos vagabundos comeram a minha gringa pelada lá na cama, Blanc, me conta? - Homem do céu, essas coisas ela não faz aqui dentro, não sei, tire esses maus pensamentos da cabeça, meu amigo.

Matando no cansaço. A gringa aguentava uma hora, ou menos. Na primeira demorou três. De repente saltava de lá do quartinho, pelada, ui, e dizia: - Tu pare de ser bobo, aí com o Aldir, os dois, deixa ele quieto, vem pra cá, vem, meu amor, pára de brigar...". Eu ia. Naquelas alturas, queriam que eu fosse onde?

Com o passar do tempo, ela permitiu que entrasse no seu coração o que supunha descaso, aí Aldir Blanc e eu amanhecíamos conversando. O fim.

Num amanhecer a gringa foi para a cozinhazinha do muquifo, de roupa, nada da nudez que adoravámos, e insultou, a plenos pulmões, a eu e ao Aldir, que estávamos numa boa, nessa madrugada eu havia lhe dado um copão de uísque, acho que bebeu, pois quando vi estava vazio. E ela não parava. Não gostei de vê-la vestida.

No meio da sua indignação, eu quieto, ouvimos um ruído de cabo de vassoura batendo no teto (venho de longe, conheço batida de vassoura), alguém batia no chão lá em cima, ela parou o gritedo por um segundo, mas logo continuou. Eu tinha alugado o morredor firme de que os moradores de cima raramente apareciam, como me atochou o cara da imobiliária. Eu estava pelado, só de chapéu, então coloquei a minha roupa e disse: - Vou lá em cima ver o que está acontecendo, ruiva, na minha ausência não judie do Aldir, se não na volta fico de mal.

Subi e bati na porta. O sujeito abriu de facão na mão esquerda, ameaçador. Falei: "O senhor me desculpe, mas isto não são horas de trocar o piso da sua cozinha, eu e minha mulher estamos começando a brigar, é seis da manhã recém, dá um tempo, amigo".

Ele respondeu: "Bati por causa do discurso da tua louca, e eu sou o dono de tudo aqui, eu que aluguei".

Tua o quê?

Tua louca, aquela avariada mental.

A imobiliária me mentiu. Ora eu morar num apê embaixo do dono, valentão e cioso de suas propriedades. Era um porão de quartinho, saleta e banheiro, este que para entrar só de lado, na cozinha só cabia fogão de duas bocas. Num átimo decidi deixar para pegar o corretor e o dono da imobiliária depois. Respondi, já ficando feliz: "Pois é, senhor proprietário, seu filho da puta, só que desta vez errou de homem, eu até ia levar livre, mas louca é a tua mãe".

Mexeu o braço do facão e lhe dei dois tiros, o segundo já no vôo de costas. Voltei, pelo lado dos canteiros de flores. A gringa e o Aldir estavam quietos.

Arrume tua mala, mulher, em dois minutos estamos fora daqui, hoje descobri que odeio a rua Voltaire Pires. Anda! Por esses milagres da natureza, ela obedeceu, veloz, talvez tenha ouvido algum estrondo, 38 longo é foda, não iria pensar em  trovão, ou nove paus de São Pedro jogando bolão com Judas em tempo bom.

Deixamos tudo, ela saiu de malinha e com o Aldir debaixo do braço, ele feliz por ter sido despregado da gelante. Larguei-os na casa de seus parentes e saí feito doido pela cidade, à procura de um cachorro morto, gaúcho não manda peixe. Demorei mas achei. Pendurei no pescoço um papel escrito os próximos serão vocês e mandei para os filhos do filho da puta, informei-me e soube que moravam juntos ali perto, liguei as coisas. Pendurei o cão morto com o papel na porta deles. Dali fui ao presídio visitar os camaradas da ala perigosa e me tranquilizei.

Ufa. Pena mesmo, ela ser tão precipitada. Se concordasse, me acompanhasse pela noite, eu acabaria brincando de casinha ao natural, tudo tem a sua hora. Nunca mais a vi, sumiu levando o Aldir.

Mania de mudar de assunto. Voltando.

E lembrem-se, amigos, acima de tudo, das noites e mulheres que ainda nos acariciam nestas doces madrugadas de Porto Alegre.

Alô, Jota Germano Pagliosa, de Bagé, vai, diz que uma flauta de quem sabe não entraria bem...




Estas mal-traçadas, verídicas pela metade (se conto tudo nunca mais arranjo namorada), pretendeu homenagear o fantástico artista e boêmio brasileiro, um homem de se tirar o chapéu quando passa, Aldir Blanc Mendes (Rio, 2/9/1946), nascido no Estácio mas homem de todos os bairros de todas as cidades do mundo, que muito cedo tornou-se e sempre será uma glória nacional.

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