Deus ajuda ateus e loucos, n'A Charge do Dias

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Os boêmios do Botequim, depois de muitos dias em silêncio, hoje se manifestaram. Os problemas começaram ainda no domingo passado, e ali por terça, quando pensaram que as coisas estavam se acalmando, o Contralouco deu de aprontar. Quase botou a cidade abaixo. Estão justificados, amigos, não vamos multá-los desta vez. Hoje parece que voltou a calmaria. Bem, calmaria não é bem a palavra, pelo que em seguida soubemos pelo correio enviado por Leilinha Ferro.

Bruno Contralouco entrou no bar falando alto, às cinco da tarde:

- Daqui até domingo, a bebida dos companheiros é por minha conta! Peguei na Mega Sena! Só hoje descobri!

Jezebel sorriu, lá vem bomba, mas, ao perscrutar o rosto do Bruno e constatar a sinceridade, apressou-se, com o dedo sobre os lábios:

- Shhhh... fica frio, tá louco, contando pra todo mundo...

O bar quase foi abaixo com essa do "tá louco". O homem quase incendeia a cidade inteira e agora ela vem falar de louco.

O alarido ainda não havia cessado quando ele jogou um monte de notas de cinquenta em cima da mesa:

- Taí, ó, pra gastar!

Depois disse os números:

- 16, idade da Libertad; 17, idade da Bruna; 23, data do nascimento da mãe da Libertad; 42, idade do maior macho que conheço, eu, sem demérito aos amigos, e 60, idade da mãe.

- Pera aí, disse Aristarco, tuas gurias estão mais velhas...

- Ah, sim, onze a mais, o cartão é de quando comecei a jogar esses números, comecei aos 31, só atualizo a minha idade.

Embolado com as conversas do Contra e do Aristarco, Clóvis Baixo havia se apressado, na ausência de Luciano e seu notibuc buscou e abriu o jornal de ontem:

- Putz, deu quina, 32 mil...

- Arranhei a bruta, joguei 58 e deu 59, por unzinho não pego 7 milhões, dividindo os 14 com um viado que pegou sozinho, viado nada, o cara deve merecer, de repente precisa mais do  que eu. Aí na mesa tem dois paus, trouxe pra queimar em trago.

- Idade de quem, essa de 58? - perguntou Marquito Açafrão.

- Deixa quieto, melhor não mexer nisso, e não é idade, é ano - respondeu o Contra com cara de sem-vergonha, para depois murmurar - Só me dá azar, essa putianga...

- Perem, deixa eu calcular - disse Tigran Gdanski rabiscando o jornal - uns 30 amigos e amigas, sexta, sábado e domingo, hummm... se gastarem pouco, na média 100 por dia, dá 300 por cabeça, vezes 30 almas, 9 mil reais! Acho bom voltar pra casa e buscar mais, esses 2 não vão fazer nem cócegas.

- Ora vai te catar, Tigran, reduzo então, até dois paus podem beber à vontade. Comida não, se quiserem comer vão comprar; comer, comem desde criança, como eu, que bebo só desde os 14, tou atrasado 14 anos, meu Deus, que tristeza. E pára de rir sozinho aí, Portuga, se não troco de bar!

O Português ria do jeito do amigo, mas aí começou a pensar na féria garantida.

Disse "Salta uma dyabla verde, Portugalino", e sentou-se na mesa central com os amigos, então dobrou-se sobre a mesa, convidando-os a fazer o mesmo, e baixou a voz:

- Antes de mais nada: se alguém encontrar o Lorildo, diz que tá perdoado, é meu eterno amigo, mesmo naquele dia eu jamais encostaria a mão nele. Segundo, pega esta, Clóvis Baixo: também pensei que fosse 32 mil. Aí o cara da Caixa disse que era 96, pagava o triplo, um negócio de jogar mais de seis números no mesmo cartão, shhh, baixa a bola. Já estendi 80 pras meninas.

Depois dessa, pulamos algumas horas de intensos papos e vamos às charges escolhidas pelos empinantes. Leilinha Ferro, que ganhou um vale-compra de 200 do Bruno, liberou geral.

S. Salvador. Aqui o menino Cícero do Pinho deu uma de Contralouco: - Essa ficaria melhor na série "Os Filhos da Puta".

Nani. Falando dos que morreram e não sabem - disse Wilson Schu.

Simanca. Para esta o Contralouco, que "ama" religiosos, exigiu parede, com moldura.

Aqui a turma foi abaixo e homenageou ao artista da semana, o próprio Contralouco, com o Sponholz.

Amarildo.

Disse Leilinha que escolheram mais duas tendo o Papa como referência, mas que o Contralouco empacou, era "demais pra bolinha desse sujeito". Que seja, falou João da Noite, que acabara de chegar, tem pessoas com quem não convém discordar.

Leilinha ficou com o Casso. Esta ela guardou do dia 24, anteontem. Eta menina porreta!

A coluna A Charge do Dias leva esse título pelo seu idealizador, o mestre Adolfo Dias Savchenko, que um belo dia se mandou para a Argentina, onde vive muito bem. Sucedeu-o na coordenação a jovem Leila Ferro, filha do Terguino, quando os boêmios amarelaram na hora de assumir o encargo. Antes eram dois butecos, o Beco do Oitavo e o Botequim do Terguino, que.., bem..., se fundiram  no ano passado (veja AQUI), face a dívidas com o sistema agiotário. O novo bar manteve o nome de um dos butecos: por sorteio ficou Botequim do Terguino, agora propriedade dos ex-endividados António Portuga e Terguino Ferro.