miércoles, 31 de julio de 2013

Papa Francisco: "Segredos do conclave"





Temos nas bancas o livro Segredos do Conclave, do jornalista Gerson Camarotti, que cobriu a eleição do Papa Francisco. 

As notícias dão conta de que Gerson foi o único jornalista no mundo a prognosticar a vitória de Jorge Bergoglio, do que não duvidamos, mesmo o cardeal brasileiro Scherer se disse surpreso. 

A escolha gerou desespero na poderosa e inflexível estrutura de governo do Vaticano, segundo o jornalista Andreas Englisch, vaticanista há duas décadas e meia, em entrevista ao Estadão: "Bergoglio era o pesadelo da Cúria durante a eleição, ele é completamente anticúria", para acrescentar que Bento XVI "nunca imaginou que a ira dos cardeais estivesse tão grande a ponto de escolherem pela revolução", e que "Nenhum cardeal foi tão maltratado (pela Cúria) como ele durante seu tempo em Buenos Aires. Uma das críticas é porque enviava os melhores padres para os pobres e não para as paróquias ricas da cidade". Ao final o vaticanista arremata: "A Cúria não tem qualquer influência sobre ele. Isso ficou claro quando se recusou a ir a um concerto de gala no Vaticano. Toda a Cúria foi, mas ele declarou que não gosta de compromissos da sociedade elegante. Acontece agora uma revolução latino-americana no Vaticano, em que as famílias europeias aristocráticas não são melhores do que as outras".

Parabéns ao Gerson Camarotti pela perspicácia, ao antever a "revolução".

Nada sabemos da política do Vaticano, que, como politica que é, é cheia de arranjos, o aliado de ontem é o inimigo de hoje e vice-versa, embora não creiamos em alianças tipo Lula-Maluf - não chegariam a gestos assim abjetos, quadro agravado pelo juramento de segredo absoluto. Porém recordamos ter lido algo a respeito do conclave que elegeu Bento XVI - Joseph Ratzinger - em abril de 2005.

De fato, na rede encontramos facilmente a matéria num jornal português, que foi reproduzida em todo o planeta naquele setembro de 2005, quando vazaram segredos do conclave de março do mesmo ano. Daí que é de se estranhar que somente Gerson tenha cogitado o nome de Bergoglio, se este foi o real adversário de Ratzinger na eleição anterior. O que teria levado a todos os demais jornalistas e experts do mundo que cobriram o último conclave, sabendo disso, a descartarem o nome de Bergoglio? Teria sido apenas pela sua idade, 76 anos? Aí está um bom assunto para pesquisa, aos interessados.

De parte deste blog, pedimos ao Papa que tome bastante cuidado com a saúde, seria uma catástrofe uma reprise de João Paulo I.

A matéria citada, de 25 de setembro de 2005, no Correio da Manhã:

Cardeal revela segredos do conclave

O conclave que converteu Joseph Ratzinger em Papa Bento XVI não foi tão ‘pacífico’ como inicialmente se pensou – revelou a ‘Limes’, a conceituada revista italiana de informação geopolítica, a qual teve acesso ao diário de um cardeal que participou no conclave. O documento revela ‘segredos proibidos’ da reunião magna de Abril passado no Vaticano, incluindo a ‘dura luta’ para a eleição entre Ratzinger e o cardeal Jorge Mario Bergoglio.

De facto, segundo a revista, a alternativa mais credível a Ratzinger não foi, como na altura se avançou, o jesuíta Carlo Maria Martini, mas sim um outro cardeal, também da Ordem de Jesus, o argentino Bergoglio que, atemorizado e pressionado acabou por recuar à última da hora.

A ‘Limes’, que manteve no anonimato a identidade do cardeal que escreveu o diário, por razões mais que óbvias, avaliou, contudo, a veracidade do documento.

Fontes do Vaticano, contactadas pela revista, limitaram-se a comentar que se as revelações são verdadeiras “estamos perante uma grave ruptura do juramento de segredo efectuado por todos os participantes no conclave”.

No essencial, o diário relata passo a passo a disputa mantida entre Ratzinger, o todo-poderoso prefeito da Congregação para a Doutrina da Fé, braço-direito do falecido Papa João Paulo II, e o cardeal arcebispo de Buenos Aires, Jorge Mario Bergoglio. 

Segundo o documento, na primeira votação, Ratzinger obteve 47 votos. Em segundo lugar classificou-se Bergoglio, um ortodoxo em questões dogmáticas mas flexível em ética sexual. À volta de Bergoglio reuniram-se todos os cardeais mais ou menos liberais e opositores a Ratzinger.

O objectivo dos ‘anti-Ratzinger’ não era contudo ganhar. A sua estratégia consistia apenas em conseguir uma minoria firme que impedisse o cardeal alemão de recolher os dois terços de votos necessários e assim renunciar a favor de um candidato mais conciliador.

Os apoiantes de Ratzinger ficaram nervosos. Bergoglio permaneceu em silêncio. Na tentativa de pacificar o diferendo, o cardeal colombiano Alfonso López Trujillo tentou convencer os cardeais sul-americanos a não optarem por Bergoglio.

Na manhã do dia 19 de Abril, segunda votação, Ratzinger subiu para 65 votos e Bergoglio quedou-se nos 35. O líder dos reformistas, o cardeal italiano Carlo Maria Martini, estava francamente optimista. Na terceira votação, Ratzinger 72, Bergoglio 40. O cardeal Martini estava cada vez mais confiante que a votação da tarde seguisse o mesmo rumo e que Ratzinger renunciaria à noite. Foi então que o próprio Bergoglio deu a entender que não se sentia preparado para assumir o pontificado. No final do conclave, o cardeal Daneels, o único que lamentou em público a eleição de Ratzinger, pronunciou uma frase, cujo significado se entende agora: “Perdemos um grande momento de eleger um Papa hispano-americano”. 



D. POLICARPO FUMAVA NO PÁTIO

O diário relata também alguns factos curiosos. É o caso do cardeal patriarca D. José Policarpo da Cruz que se deslocava várias vezes ao pátio para fumar os seus cigarros, dado que no quarto não podia abrir as persianas, que permaneceram sempre fechadas por razões de clausura. Instado a comentar o diário, o assessor de D. Policarpo, padre Jardim Gonçalves, afirmou que “o cardeal não comenta o que se passou no conclave”. 

Outro dado revelado no diário relaciona-se com um grupo de cardeais que se posicionou contra o “conflito de interesses” de Joseph Ratzinger que era o decano, portanto o organizador do conclave e simultaneamente o principal candidato ao Pontificado. Foi então proposto que o decano seguinte se tiver mais de 80 anos, não poderá aspirar ao papado. Mas a ideia não vingou. O actual decano é o secretário de Estado, Angelo Sodano, prestes a completar 79 anos. 



À MARGEM

REACÇÃO DO VATICANO

Sobre o diário, o Vaticano comentou apenas que se for verdade o que está escrito “estamos perante uma grave ruptura do juramento de segredo que todos os participantes assumiram”.

VOTAÇÃO FINAL

Já depois de Bergoglio ter dado a entender que não queria ser Papa, a quarta e última votação deu a tão almejada maioria a Joseph Ratzinger.

SILÊNCIO

Entre os cardeais no conclave, antes de ser revelado o nome de Joseph Ratzinger como o novo Papa, “fez-se um longo silêncio seguido de um largo e cordial aplauso”, diz o diário.

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