.
Por Wilson Figueiredo, no JB
Com a aproximação da data de abertura da temporada do mensalão no Supremo Tribunal Federal, o espetáculo passou a ser avaliado, de todos os lados, por atores e autores. Mas os 38 personagens entenderam melhor deixar vago o papel principal até a hora de entrarem em cena. Ingratidão com Luiz Inácio Lula da Silva. A opinião pública ainda não faz juízo de valor político, mas desperta para o que der e vier. Temporadas teatrais em agosto garantem casa cheia.
De tudo se cogitou, menos da impossibilidade de Luiz Inácio Lula da Silva excluir-se moralmente da questão central no julgamento que abre a temporada. Por motivos óbvios, não foi devidamente considerada a circunstância de que Lula não terá como ficar de fora, enquanto prevalecer a observação de Buffon (Georges Louis), o grande classificador do gênero animal, para quem “o estilo é o homem”. (A falta de estilo, também). Excluí-lo seria ingratidão. O ex-presidente estará implícito no que for decidido, ainda que por intermédio de José Dirceu, pois as circunstâncias os tornaram inseparáveis. Dirceu dentro do processo, Lula por fora. A avant-première no dia 2 de agosto de 2012 abre a temporada e começa a encerrar o ciclo que reuniu Lula e Dirceu, sem sobrar para mais ninguém.
Mesmo não figurando entre os 38 sobreviventes dos 40 indiciados, dos quais um está morto e o outro se fez colaboracionista na apuração da verdade — o nome da figura oculta no processo é Luiz Inácio Lula da Silva. É ele, mesmo sem pisar no palco, quem vai projetar a sombra da ilusão de poder por vinte anos interrompidos na metade.
A presença de Lula no julgamento do Supremo estará implícita em tudo que disser respeito à responsabilidade política pelo que aconteceu (sem menosprezo pelo que ficou de fora da peça). Nesse sentido é que o julgamento, queiram ou não os que se recusam a admitir o conteúdo político dos fatos, divide desigualmente, pelo menos no episódio do mensalão, as responsabilidades de Lula e Dirceu perante a História.
É provável que, para o ex-presidente Lula, o mensalão seja o ponto mais alto de uma frustração de mando republicano que não se contenta com dois mandatos sucessivos, e uma oposição encalhada. Ficou mais nítida a responsabilidade política, mais dele que de qualquer outro, seja no proveito político, no saldo eleitoral, no descrédito dos partidos, ou na degradação representativa no nível político e no botim do mensalão.
A opinião pública guardou distância e não quis saber de debate. Esperou, sem ilusões, o momento de saber quem foi quem no usufruto do beneficio extra que, por não ser batizado, continua pagão e atende pelo apelido de mensalão. Que, de resto, não passa de aumentativo evasivo.
Quem mensalou, perdeu ou vai perder o respeito dos eleitores. A questão de saber quem, afinal, autorizou o botim, podia levar ao ex-presidente Lula, mas quem veio a ser sacrificado foi José Dirceu, despejado da Casa Civil pelo próprio Lula, que teve o desassombro de dizer que nada sabia do que se passava ao seu lado. A Dirceu coube administrar o equilíbrio instável da maioria parlamentar, em nome e no interesse do governo Lula da Silva.
O ex-presidente pode não saber operar a máquina administrativa, mas não subestima a natureza humana como alternativa. Na falta de palavras adequadas, pode-se considerar que ele, realmente, não sofreu o assédio da dúvida ao sacrificar o então chefe do seu Gabinete Civil com a escusa de que tinha sido o último a saber, e o demitiu como quem pratica um ato em legítima defesa.
Mesmo considerando a questão pelo avesso, Lula tirou o corpo fora da responsabilidade e não pensou duas vezes para sacrificar, também politicamente, o chefe da sua Casa Civil, que era mais do que um puxadinho.
(A charge do Sponholz não consta no original, foi incluída por este blog)
No hay comentarios.:
Publicar un comentario